domingo, 1 de dezembro de 2024

"O que o Sol faz com as flores" de Rupi Kaur

Conheci Rupi Kaur através do livro "Outros jeitos de usar a boca" e fiquei encantada tanto com o estilo de poesia simples e claro que ela utiliza para se expressar quanto com os assuntos que ela escolhe abordar. A leitura de "O que o sol faz com as flores" foi minha segunda experiência com a autora e foi tão linda quanto a primeira, esse é o tipo de livro que me fez sofrer, pensar, amar, chorar e desejar recomeçar coisas das quais eu já tinha desistido.

O livro é dividido em cinco partes intituladas: "murchar", "cair", "enraizar", "crescer", "florescer". E nessas partes ela vai falando com sua poesia simples e de fácil compreensão sobre como nós mulheres vivemos determinadas experiências de dor, de amor, de desamparo, de voltar a vida, de nos desenvolvermos no mundo até o momento no qual nos sentimos maduras e plenas.

Viver é uma grande experiência onde tudo pode nos acontecer, nos ferir, nos restaurar. As vezes nos sentimos muito sozinhas em nossos processos, muitas vezes eu me sinto muito sozinha em meus processos e a poesia de Rupi Kaur mais uma vez veio me dizer que não estou tão sozinha assim, muitas mulheres no mundo passam pelo que passo e sobrevivem ao processo de murchar e cair e enraizar e crescer e chegar até o florescer.

Na primeira parte, "murchar", a gente acompanha vários textos sobre a dor sofrida e solitária que nos acomete quando uma relação intima, mesmo quando abusiva, se rompe.
"no último dia do amor
meu coração quebrou dentro do corpo"
As primeiras partes, "murchar" e "cair", são as partes mais sofridas do livro e me fez pensar que o sentido do título do livro era falar só de dor e que o sol faz isso com as flores, ele as queima. Porém não é sobre isso, a dor é uma parte da experiência humana não um fim. Não é o proposito da nossa existência sofrer, mas o sofrimento existe.
"ontem
quando saí da cama
o sol caiu no chão e rolou pela grama
as flores decapitaram a si mesmas
a única coisa viva que sobrou fui eu
e eu já não sei se isso é vida"

- depressão é uma sombra que mora em mim
Rupi Kaur explora também o processo de vencer a dor, a experiência de se fazer semente, de se plantar no chão. A experiência de entender o quanto nós temos que nos responsabilizar por nós mesmas.
"muitas vezes
sentimos raiva dos outros
por não terem feito
o que deveríamos fazer por nós mesmos"

- responsabilidade

A autora também aborda a vida dos emigrantes indianos nos Estados Unidos: as dificuldades enfrentadas pela primeira geração que saiu da Índia em busca de oportunidade, as portas abertas para a segunda geração, o desconcerto de uma identidade dividida entre dois mundos culturais, a relação com os pais permeada pelo orgulho e amor, elementos do ato de "enraizar" e "crescer".

A parte mais linda, mais doce e que mais me abraçou, confortou e me jogou para frente foi a ultima parte: "florescer".

"eu não vou
comparar meu caminho ao caminho dos outros"

- me recuso a fazer um desserviço à minha vida
São textos simples e diretos, muitas vezes dizem o óbvio, mas até mesmo as coisas autoevidentes precisam ser ditas uma vez e outra, pois a memória nos cria peças, esquecer é fácil a ponto de sermos constantemente lembradas do fundamental pode se tornar essencial a nossa sobrevivência.
"o ano acaba. espalho os último trezentos e sessenta
e cinco dias na minha frente no tapete da sala de casa

este aqui é o mês em que decidi largar tudo que não
influenciasse profundamente os meus sonhos. o dia em que
me recusei a ser a vítima. esta é a semana em que dormi
na grama. na primavera eu torci o pescoço da insegurança.
deixei a sua gentileza de lado. derrubei o calendário. aqui
a semana em que dancei com tanta empolgação que meu
coração aprendeu a flutuar de novo. o verão em que tirei
todos
os espelhos da parede. eu não precisava mais me ver para me
sentir vista. tirei o peso do meu cabelo com o pente.

dobro os dias bons e ponho todos no bolso de trás da calça
só por segurança. acendo um fósforo. queimo tudo que seja
supérfluo. o calor do fogo aquece meus dedos do pé. pego
um copo de água morna para me limpar inteira para janeiro.
estou chegando. mais forte e mais inteligente rumo ao novo."
"não há
mais nada
que você possa temer
o sol e suas flores chegaram."

2 comentários:

  1. tb li o da boca. tem um jeito lindo de escrever. gostei muito. esse não li. beijos, pedrita

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  2. Eu ainda não li nada da autora. E olha que já ouvi e li "trocentos" comentários sobre o Outros jeitos de usar a boca. Mas eu quero ler, rsrs.

    Beijo

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