Assim, particularmente, EU não sou fã de Monteiro Lobato, li alguns de seus livros: As caçadas de Pedrinho, Saci e os dois volumes de Os doze trabalhos de Hércules ainda quando era criança, entre os nove e os doze, e posteriormente fiz algumas pesquisas sobre ele e vou confessar que mesmo quando era criança não era fã.
Sempre me desagradava a maneira que Emília tratava Tia Anastacia e todo mundo, ela é extremamente mal educada e minha avó era negra (era pq faleceu) e na minha imaginação infantil algumas coisas me entalavam com Emília e o fato de Narizinho não ir a escola me dava abuso, sempre adorei a escola (mesmo quando vivi problemas a escola era um lugar que eu gostava)... Isso me referindo "As caçadas de Pedrinho" e ao livro "Saci", só li "Os doze trabalhos de Hercules" pq aos 12 anos eu já era louca de amor por Mitologia Grega (Cavaleiros do Zodiaco também é cultura táh, sempre acho interessante a versão oriental dos mitos ocidentais) e também vivi essa angústia pq Narizinho não vai a essa aventura, fica cuidando da avó no Sítio.
Enfim, depois de começar a estudar história fui dá uma olhadinha em "Reinações de Narizinho" e me estarreci com um Monteiro Lobato que diz que Tia Anastacia é a "negra de estimação" do Sítio!!! Ops, o que é isso? Fala sério!!!
Ah, lembrei da história que me fez ver Reinações, conto ela aqui pq acho importante: uma amiga ganhou de uma amigo uma edição de "Histórias de Tia Anastacia", é que ela tem uma filhinha e gosta de ler histórias para ela, minha amiga foi ler para a menina dela despreocupadamente e imagine só o que aconteceu?
Ela me confidenciou que enrolou a pirralha e não terminou nem a primeira página. Graças a Deus! Afinal basta o mundo para expor as crianças de cor a situações de preconceito e violência simbólica, elas não precisam vivenciar esse tipo de experiência dentro de casa e menos ainda na hora de dormir. E seria hipocrisia da parte de qualquer um negar que o preconceito existe e que situações simbolicamente e as vezes concretamente violêntas são rotina na vida de homens e mulheres de cor no Brasil.
Deixa esse livro para a menina ler quando for mocinha e tiver meios intelectuais para entender o contexto histórico em que a obra de Monteiro Lobato foi escrita, quem era o homem e a própria história afro-brasileira néh! "Vamos devagar com o andor que o Santo é de barro"
Aliás, sobre ir "devagar com o andor pq o santo é de barro", acho que é mais ou menos isso que propõe o Conselho Nacional de Educação com o Parecer CNE/CEB n°.15/2010 (que está aguardando homologação pelo Ministério de Educação), cujo assunto é uma possível “orientação para que a Secretaria de Educação do Distrito Federal se abstenha de utilizar material que não se coadune com as políticas públicas para uma educação antirracista”. Algo que é muito pertinente, se a Secretaria de Educação pretende distribuir nas escolas livros de Monteiro Lobato, ou qualquer outro autor que nesse livros existam Introdução, Prefacio ou notas de rodapé esclarecendo sobre o período histórico, sobre as relações interracias que marcaram esse periodo e derivativos. Afinal as histórias de Monteiro Lobato que chegam até nós através da Globo são muito diferentes das que chegam através do punho do autor.
Quando comecei fazer releituras da obra de Monteiro Lobato entendi coisas que não percebia antes, mais tarde passei a me debruçar com mais atenção sobre a História Afro-brasileira, que é a história de todos nós, e sobre os intelectuais afro-brasileiros... Descobrir Solano Trindade, redescobrir Machado de Assis, encontrei com um José Carlos do Patrocínio, "Tigre da Abolição" e tantos outros nomes que marcaram nossa história que são esquecidos, nem aparecem nos livros didáticos e ainda de quebra são embranquecidos.
Ah, lembrei da história que me fez ver Reinações, conto ela aqui pq acho importante: uma amiga ganhou de uma amigo uma edição de "Histórias de Tia Anastacia", é que ela tem uma filhinha e gosta de ler histórias para ela, minha amiga foi ler para a menina dela despreocupadamente e imagine só o que aconteceu?
Ela me confidenciou que enrolou a pirralha e não terminou nem a primeira página. Graças a Deus! Afinal basta o mundo para expor as crianças de cor a situações de preconceito e violência simbólica, elas não precisam vivenciar esse tipo de experiência dentro de casa e menos ainda na hora de dormir. E seria hipocrisia da parte de qualquer um negar que o preconceito existe e que situações simbolicamente e as vezes concretamente violêntas são rotina na vida de homens e mulheres de cor no Brasil.
Deixa esse livro para a menina ler quando for mocinha e tiver meios intelectuais para entender o contexto histórico em que a obra de Monteiro Lobato foi escrita, quem era o homem e a própria história afro-brasileira néh! "Vamos devagar com o andor que o Santo é de barro"
Aliás, sobre ir "devagar com o andor pq o santo é de barro", acho que é mais ou menos isso que propõe o Conselho Nacional de Educação com o Parecer CNE/CEB n°.15/2010 (que está aguardando homologação pelo Ministério de Educação), cujo assunto é uma possível “orientação para que a Secretaria de Educação do Distrito Federal se abstenha de utilizar material que não se coadune com as políticas públicas para uma educação antirracista”. Algo que é muito pertinente, se a Secretaria de Educação pretende distribuir nas escolas livros de Monteiro Lobato, ou qualquer outro autor que nesse livros existam Introdução, Prefacio ou notas de rodapé esclarecendo sobre o período histórico, sobre as relações interracias que marcaram esse periodo e derivativos. Afinal as histórias de Monteiro Lobato que chegam até nós através da Globo são muito diferentes das que chegam através do punho do autor.
Quando comecei fazer releituras da obra de Monteiro Lobato entendi coisas que não percebia antes, mais tarde passei a me debruçar com mais atenção sobre a História Afro-brasileira, que é a história de todos nós, e sobre os intelectuais afro-brasileiros... Descobrir Solano Trindade, redescobrir Machado de Assis, encontrei com um José Carlos do Patrocínio, "Tigre da Abolição" e tantos outros nomes que marcaram nossa história que são esquecidos, nem aparecem nos livros didáticos e ainda de quebra são embranquecidos.
Descobrir nessa onda os motivos de Monteiro Lobato tecer sua narrativa e, sinceramente, minha opinião pessoal é que o fato dele ser um grande nome da Literatura Brasileira mostra apenas que o brasileiro é racista e machista e nem percebe. (Mas, isso é pessoal viu gente).
Bem, essa é minha opinião pessoal sobre o tema e como este é meu blog é um lugar mais que adquado para colocar essa opinião.
Ainda sobre Monteiro Lobato e minhas pesquisas sobre ele e a questão do afro-descendente, encontrei um conto dele que tem o titulo "Negrinha" e fala de uma menina que mesmo depois da Abolição continua sendo tolerada na casa da ex-senhora de sua mãe para ser vitima de violência e maus tratos constantes até morrer de febre e ninguém nem perceber direito... Nesse conto a gente encontra um Monteito Lobato que denuncia as violências sofridas pelos homens e mulheres, violência contra a criança, detalhes de uma sociedade altamente hipócrita e derivativos... Nas palavras dele de negrinha ficaram apenas duas impressões:
"Uma cômica, na memória das meninas ricas:
— Lembras-te daquela bobinha da titia, que nunca vira boneca?
Outra de saudade, no nó dos dedos de D. Inácia: — Como era boa para um cocre!..."
(LOBATO, 1927)
Juntando esse conto com as obras infantis a gente ver a ideia de Monteiro Lobato a cerca do lugar do negro na sociedade: sempre servindo e na dependência dos brancos de posse... Ou uma sofrida Negrinha, "negra de estimação" de uma mulher má ou uma boa tia Anastácia, "negra de estimação" de uma mulher boa e generosa como Dona Benta! Sempre vistos como seres a servir, colocados na copa e na cozinha, sempre com seus destinos a serem determinados por terceiros... Eu detesto essa forma de olhar... e mesmo sabendo o momento histórico de Monteiro Lobato e considerando tudo isso, sei essa visão de mundo e essa forma de relação interracial ainda persiste em nossa sociedade, é uma continuidade.
Bem, minhas sinceras desculpas aos fãs do homem, eu não sou ninguém no jogo do bicho, minha opinião é só minha opinião táh, mas é justamente desconstruir essas imagens do Negro em nossa História que humildemente pessoas como eu, que trabalham pesquisando História e Cultura Afro-brasileira, querem.
Queremos que as pessoas percebam que embora homens e mulheres de cor tenham ocupado esses lugares de sofrimento e subordinação houveram outros lugares para eles... Os negros não foram apenas escravos, foram também homens e mulheres que superaram a escravidão, chegaram aqui e deram a volta por cima. A abolição não é resultado apenas do trabalho de homens como Joaquim Nabuco ou dos interesses dos ingleses, mas sim do trabalho duro e constante de homens e mulheres negros e negras que compunham uma imprensa negra, pessoas que se movimentavam não só fisicamente como intelectualmente, que organizavam um discurso que validava a Abolição, organizavam fugas coletivas, faziam coisas que até Deus duvida e que me enchem de orgulho de ser herdeira de uma cultura afro-descente, tanto quando sou herdeira da cultura portuguesa e indígena.
Ah, como professora, mesmo não morrendo de amores, eu até trago Monteiro Lobato para a roda de leitura, não dá para ignora-lo, mas trago através dos estudos recentes sobre a representação do negro na literatura infantil, como por exemplo a desses textinhos legais que capinei na net com a ajuda de pessoas que também pesquisam esse tema, a saber:
Queremos que as pessoas percebam que embora homens e mulheres de cor tenham ocupado esses lugares de sofrimento e subordinação houveram outros lugares para eles... Os negros não foram apenas escravos, foram também homens e mulheres que superaram a escravidão, chegaram aqui e deram a volta por cima. A abolição não é resultado apenas do trabalho de homens como Joaquim Nabuco ou dos interesses dos ingleses, mas sim do trabalho duro e constante de homens e mulheres negros e negras que compunham uma imprensa negra, pessoas que se movimentavam não só fisicamente como intelectualmente, que organizavam um discurso que validava a Abolição, organizavam fugas coletivas, faziam coisas que até Deus duvida e que me enchem de orgulho de ser herdeira de uma cultura afro-descente, tanto quando sou herdeira da cultura portuguesa e indígena.
Ah, como professora, mesmo não morrendo de amores, eu até trago Monteiro Lobato para a roda de leitura, não dá para ignora-lo, mas trago através dos estudos recentes sobre a representação do negro na literatura infantil, como por exemplo a desses textinhos legais que capinei na net com a ajuda de pessoas que também pesquisam esse tema, a saber:
Imagens do negro na literatura infantil brasileira: análise historiográfica. de Maria Cristina Soares. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 31, nº 1, p.77-89, janº/abr.2005. Disponível aqui!
A figura do negro em Monteiro Lobato. de Marisa Lajolo. Presença Pedagógica. vol. 4, nº 23, p. 23-31, set/out. 1998. Disponível aqui!
O universo ideológico da obra infantil de Monteiro Lobato de Zinda Maria Carvalho de Vasconcelos.
A figura do negro em Monteiro Lobato. de Marisa Lajolo. Presença Pedagógica. vol. 4, nº 23, p. 23-31, set/out. 1998. Disponível aqui!
O universo ideológico da obra infantil de Monteiro Lobato de Zinda Maria Carvalho de Vasconcelos.
"... a autora analisa a obra infantil de Lobato com argúcia, perspicácia e conhecimento de causa, apoiada na sua própria ideologia, mas sem preconceito, numa brilhante crítica que sabe compreender e interpretar não só a obra, mas também a personalidade e as contradições do escritor que, sendo intransigente fiel a si mesmo, foi igualmente fiel ao Brasil e às suas crianças."
Acho absurdo que os livros de Monteiro Lobato venham para as escolas com nota de rodapé falando sobre as questões ambientais que cercam "As caçadas de Pedrinho" e não falem sobre as questões que envolvem as relações raciais e acho que a denuncia de Antônio Gomes da Costa Neto, mestrando da UNB e toda a polêmica gerada em torno são o máximo... Se queremos construir um Brasil verdadeiramente igualitário onde a cidadania de direito seja exercida de fato por todos temos mesmo que colocar nossa boca no trombone!!!
Não é questão de banir as obras de Monteiro Lobato, como a imprensa alardeou aos sete ventos nas últimas semanas, mas sim de não deixar passar em branco as relações raciais contidas na obra do homem... e sobre isso tem um texto muito interessante no Blog da Cidinha... Achei super esclarecedor e recomendo!
Acho absurdo que os livros de Monteiro Lobato venham para as escolas com nota de rodapé falando sobre as questões ambientais que cercam "As caçadas de Pedrinho" e não falem sobre as questões que envolvem as relações raciais e acho que a denuncia de Antônio Gomes da Costa Neto, mestrando da UNB e toda a polêmica gerada em torno são o máximo... Se queremos construir um Brasil verdadeiramente igualitário onde a cidadania de direito seja exercida de fato por todos temos mesmo que colocar nossa boca no trombone!!!
Não é questão de banir as obras de Monteiro Lobato, como a imprensa alardeou aos sete ventos nas últimas semanas, mas sim de não deixar passar em branco as relações raciais contidas na obra do homem... e sobre isso tem um texto muito interessante no Blog da Cidinha... Achei super esclarecedor e recomendo!