Conheci a
Edith Nesbit através do conto
"Melisande" publicado em e-book pela Sociedade das Relíquias Literárias. Fiquei encantada com a prosa alegre, dinâmica, cheia de magia e aventura que a autora conseguiu apresentar em um conto. Fui atrás de conhecer outras obras dela publicadas em português e assim encontrei
"O Castelo Encantado", minha primeira e tão maravilhosa leitura de 2025.
Em "O Castelo Encantado" somos apresentados a um grupo de três irmãos: Gerald, Jimmy e Kathleen que devido a uma sucessão de acontecimentos acabam tendo que passar suas férias numa escola esvaziada sob o cuidado de uma criada e uma professora francesa, para aproveitar o bom tempo e a boa companhia uns dos outros, eles decidem desbravar os arredores da escola e acabam descobrindo uma linda propriedade com ares de castelo italiano cheia de mistérios, um verdadeiro Castelo Encantado.
Para os padrões do século XXI, nossos protagonistas são pessoas no início da adolescência entre os 12 e os 15 anos, vindos de uma família financeiramente estável, muito espertos, cheios de curiosidade e vontade de conhecer o mundo e desbravar. O líder da equipe é o Gerald, muito imaginativo, cria em sua cabeça narrativas que transformam qualquer situação corriqueira em algo aventuresco, Jimmy é o mais novo que muitas vezes questiona a autoridade de Gerald e Kethleen é a voz da sensatez, garota esperta, parceira, generosa e corajosa. Rapidamente o grupo ganhou meu afeto e me fez sentir como se eu fosse novamente uma pessoa entre o fim da infância e o início da adolescência, com vontade de saber o que existe além da curva da Rua Nova Descoberta que eu via do muro da minha casa.
É desbravando o mundo contido no pequeno espaço da vila onde a escola que hospeda nossos jovens exploradores estão hospedados que eles encontram a grande propriedade medieval que eles consideram um Castelo Encantado e nela a criativa e inteligente Mabel e de pronto forma-se o quarteto. Inicialmente a menina Mabel entra na equipe ao pegar nossos exploradores em um engodo ou brincadeira, eles chegam no castelo bem no momento que ela está deitada em um banco no centro de um labirinto formado por cercas vivas... Ela finge ser uma Princesa Adormecida esperando para ser acordada por um beijo... quando o Jimmy a beija ela desperta e leva o grupo para dentro da casa totalmente imersa na brincadeira fazendo eles e a gente duvidarem se a magia é real ou não.
"- Acho que a mágica deixou de existir quando as pessoas começaram a ter motores a vapor - Jymmi insistiu -, e jornais, e telefones e telégrafos sem fio.
[...]
- Talvez a mágica tenha deixado de existir porque as pessoas não acreditam mais nela - disse Katheleen."
Todavia, se o fato da Mabel ser uma Princesa Adormecida era um engodo, brincadeira, da Mabel quando ela leva os meninos para a sala das joias da propriedade e tira um anel misterioso da coleção e ele a torna invisível o maravilhoso, o fantástico, o misterioso subitamente se torna bem real pois o anel a torna invisível e nosso quarteto de aventureiros precisa lidar com isso, descobrir como o anel funciona, reverter seus efeitos, viver a magia.
O livro é SENSACIONAL! Uma aventura MARAVILHOSA! A partir do contato dos nossos jovens aventureiros com o anel mágico se dá uma sucessão de eventos deliciosos. O livro está dividido em 12 capítulos e cada capítulo é um episódio diferente dessa aventura em torno de um anel mágico que torna as pessoas invisíveis e faz muitas outras coisas, a grande propriedade com ares de Castelo Italiano com seu Jardim Maravilhoso, suas Passagens Secretas e Mistérios vai envolvendo o coração das crianças e da pessoa leitora. Ler a Edith Nesbit se torna uma experiência mágica em si mesmo, muitíssimo divertida, completamente lúdica e um pouquinho didática também.
"- Bom, não vamos estragar o show com descrenças velhas e bobas - disse Gerald, decidido. - Vou acreditar em mágica tão intensamente quanto puder. Este é um jardim encantado, e eu vou explorar, nada vai me impedir."
As relações das crianças entre si em meio às situações problemáticas e desafiadoras que o uso da magia do anel vai trazendo para elas é muito instigante e gostosa de acompanhar, aquele constante resolver um problema e criar outro e então vamos resolver e assim sucessivamente. A relação com os adultos que as cercam, a professora francesa do Colégio Interno, a Tia da Mabel e o administrador da propriedade, também são ótimas e bem dentro da dinâmica social da vida nas Áreas Rurais da Inglaterra de fins do século XIX e início do século XX.
Gerald, como já disse, é um líder natural e como um menino crescido numa sociedade machista, muitas vezes fala uns absurdos, mas as meninas nunca deixam barato para ele. É uma delícia as respostas que a Mabel e a Kathleen dão a ele quando ele se passa demais.
"Quando eu me casar - disse Gerald - vou me casar com uma garota muda, ou usar o anel para fazer com que ela só fale quando falarem com ela. Venham vamos dar uma espiada.
[...]
- Acho que eu vou me casar com um garoto mudo - interrompeu Mabel -, e não vai haver heróis nos livros que vou escrever, só uma heroína. Vamos Cathy."
A leitura da prosa da Edith Nesbit me trouxe uma alegria e uma leveza maravilhosa. Ela é uma autora sensacional e seminal para a Literatura Fantástica do Século XX facilmente vamos identificar sua influência na obra de diversos autores.
"Acho que as coisas encantadas não são maldosas. Elas simplesmente se divertem nos pondo em situações difíceis ou perigosas."
J. R. R. Tolkien, "O Hobbit" e "O Senhor dos Anéis" cujas tramas também giram em torno de um Anel Mágico que torna seu usuário invisível e traz consigo várias implicações. C. S. Lewis o qual nos volumes de "As Crônicas de Nárnia" coloca grupos de crianças/adolescentes desvendando os mistérios de um mundo mágico, quando a gente confronta "O Castelo Encantado" e "O Leão, a Feiticeira e o Guarda-Roupa" as semelhanças são impressionantes. Monteiro Lobato também bebeu bastante na fonte da Edith, a forma como as crianças vivem aventuras no "O Sítio do Picapau Amarelo", Pedrinho, Narizinho, Emília e as maravilhas do mundo sendo confrontadas, desfrutadas, aprendidas
"Existe uma cortina fina como uma teia de aranha, clara como o vidro, forte como o ferro eternamente pendurada entre o mundo da magia e o mundo que, para nós, parece real. E, a partir do momento em que as pessoas descobrem um dos pequenos e fracos pontos dessa cortina, que são caracterizados por anéis mágicos e amuletos e coisas do tipo, tudo pode acontecer."
Claro, se compararmos a forma como as relações entre meninos e meninas são construídas, a prosa da Edith Nesbit é bem mais empoderadora que a do Monteiro Lobato, Tolkien ou C. S. Lewis. As meninas da Nesbit são ativas, não se furtam da aventura, não tem interesse romântico, quando os meninos afrontam elas respondem a autora, não precisam ter a forma de uma boneca para se colocarem no mundo como protagonistas em situações de perigo.
Estou muito apaixonada pela prosa dessa autora, pelas ideias que ela expressa em sua obra, pela forma como ela retrata meninos e meninas vivendo aventuras juntos em colaboração e conflito construindo amizades duradouras. Tenho mais uma autora para colecionar e comentar nessa vida.
não conheço. beijos, pedrita
ResponderExcluir