sábado, 1 de julho de 2023

"Mulher-Maravilha 01/51: Além-Mundos" de Michael W. Conrad e Becky Cloonan


A "Mulher-Maravilha" foi a minha porta de entrada para o mundo dos quadrinhos americanos. Ela é um símbolo muito conhecido de mulher forte. No imaginário coletivo é vista como alguém capaz de enfrentar os homens e vencer. Ainda não superei a frustração de perceber o quanto nem sempre as histórias da Princesa das Amazonas trazem ao leitor essa mulher forte consagrada no imaginário coletivo.

Ainda me sinto frustrada em recordar o quanto detestei a "Mulher-Maravilha dos Novos 52". A arte do Cliff Chiang realmente é espetacular, mas foi dureza acompanhar o Brian Azzarello derrubando o heroísmo da Diana a cada passo, desconstruindo a ideia de irmandade entre as Amazonas e, por derradeiro, dando a uma personagem pacifista em sua origem o título de Deusa da Guerra. Fiquei traumatizada e com o pé atrás diante de toda e qualquer publicação da mais famosa das heroínas. Foi com esse pé atrás que recebi a "Mulher-Maravilha: Além-Mundos" construída pela parceria do Michael W. Conrad com a Becky Cloonan.

Em "Mulher-Maravilha: Além-Mundos" encontramos a Diana enfrentando o seu pós-vida. Como ela veio a morrer? Não sei! Só sei que ao abrir a primeira página da HQ encontramos o próprio Siegfried dando boas vindas a ela em Asgard, Paraíso da Mitologia Nórdica, mundo no qual todos os dias se luta até a morte e todas as noites se desfruta de um banquete até a fartura, embriagues e sono.


Nesse momento, Diana encontra-se um tanto desmemoriada, então, a sincronia entre mim, uma leitora totalmente fora do contexto dos fatos anteriores à morte dela, e ela foi imediato. Esse inicio de aventura é lúdico e dinâmico, a Mulher-Maravilha se esbalda na batalha, mostra todos os seus dons como guerreira, e se diverte no momento do banquete. Estaria tudo bem se não fosse o mistério que acompanha o intervalo entre ela perecer no campo de batalha e voltar a vida no momento do banquete.


Há um mistério no ar, pois sendo a Diana um personagem ligado a Mitologia Grega o seu pós-vida de forma alguma deveria ser ligado a Mitologia Nórdica. Ela está deslocada por algum motivo, tem algo estranho no ar, ela sente, se incomoda e investiga. Durante a investigação ela encontra como aliado o esquilo Rastatok, descobre ter algo errado com Yggdrasil, Árvore da Vida da Mitologia Nórdica, e resolve ajudar.


O vol. 1 de "Mulher-Maravilha: Além-Mundos" é a apresentação do cenário de uma aventura, do problema a ser resolvido e dos aliados da heroína nesse processo. A arte do Travis Moore é linda, a ambientação de Asgard é um deleite para os olhos assim como a coragem da Diana em enfrentar os problemas com o peito aberto, mesmo sem lembrar muito bem de quem é e de onde vem. Os obstáculos são postos e como uma mulher maravilhosa que é, a Princesa das Amazonas realmente vence todos eles, não tem seu heroísmo questionado, não é vencida pelas circunstâncias, é corajosa acima de tudo e vitoriosa acima das situações postas. Terminei me sentindo instigada em acompanhar a aventura.

O ponto negativo é o fato de, apesar de existirem várias mulheres desenhadas entre a população guerreira de Asgard, Diana não faz amizade com nem mesmo uma personagem do gênero feminino. O roteiro lembra os filmes da Disney no qual a princesa fala com animais e encontra uma dúzia de homens misteriosos e de bom coração para ir tanto convidando ela a aventura quanto indicando a ela as missões a serem cumpridas e os caminhos impossíveis que ela deve cruzar e vencer.

Por um lado entendo o conceito da Mulher-Maravilha como uma vencedora no mundo do Patriarcado, por outro incomoda muitíssimo a ausência de outras mulheres como aliadas. Todas nós, mulheres, sabemos até ser possível encontrar nesse mundo homens para nos ajudar, mas nossas principais aliadas são mulheres, na vitória e na derrota são nossas irmãs as pessoas que nos oferecem ajuda, solução e conforto.


Ainda nesse volume encontramos a história "De Volta ao Lar: Parte Um" onde se conta a origem da Yara Flor, Mulher Maravilha do Estado de Futuro, aqui apresentada como Wonder Girl (Moça-Maravilha), roteirizada e desenhada pela Joëlle Jones.


Amo tanto a arte quanto o trabalho de roteirização da Joëlle Jones, conheço ela da Graphic Novel "Lady Killer", publicada no Brasil pela Darkside, e da Mulher-Gato, ambos trabalhos maravilhosos. Ela é muito boa em criar histórias dinâmicas com mulheres urbanas fortes de decisão rápida com personalidade independente e dotou Yara Flor de todos esses dons. Porém, ainda sigo insatisfeita com o fato de uma personagem que ganha destaque por ser indígena ser roteirizada por uma mulher não indígena. É muito difícil vê alguém cujo trabalho admiramos fazendo algo duvidoso e essa é a minha situação com a Joëlle. Por um lado gosto do tom da autora, por outro, honestamente, sem palavras para descrever o constrangimento.


Sobre a origem da Yara Flor, ela é natural do Brasil, mas migrou na infância para os Estados Unidos e cresceu no estado Idaho, criada por sua tia Renata. O fato dela ter sido criada longe da Amazônia pode justificar a distância existente entre a forma de viver e agir dela em relação a forma de viver e agir dos povos indígenas, mas ainda acho muito complicado colocar uma mulher branca, loira dentro de todos os padrões americanos, para roteirizar e desenhar uma mulher não-branca de origem indígena que viveu toda a sua vida em um estado norte-americano com 88% da população formada por pessoas brancas, apenas 1,4% da população é indígena e 0,8% são afro-americanos. A experiência de ser minoria impacta na formação de um ser humano e a Joëlle, por mais legal que seja, não transpõe isso para o papel, não traz essa camada para a personagem.


A parte minhas críticas, é muito bom vê a forma firme como a Yara Flor se posiciona no mundo, em sua história de origem ela já transpira poder e proatividade, é voluntariosa e salva o dia e as pessoas em seu entorno mesmo antes de adquirir o poder e a super força característica das amazonas.


Amei a forma como a Yara Flor adquire sua arma emblemática, uma  boleadeira, arma utilizada pelos povos indígenas da América para caçar que até hoje segue sendo utilizada na região dos Pampas Gaúchos. A Wonder Girl recebe seus poderes das mãos da própria Iara, Ser Encantado da Mitologia Indígena Brasileira, protetora das águas dos rios, em uma cena lindíssima.


Nesse momento, não dá para esperar representatividade ou situações com as quais mulheres indígenas ou imigrantes latino americanas possam ser sentir representadas, mas a história da Yara Flor tem tudo para ser bem narrada, com uma arte linda e cheia de girl power.

3 comentários:

  1. eu via HQs como esses em feiras. beijos, pedrita

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  2. Realmente problemático quem roteirizou a Yara Flores, mas pelo menos temos uma representatividade ne kkkk
    https://www.balaiodebabados.com.br/

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  3. Oi Pandora! Tudo bom?
    Infelizmente, não tenho o costume de ler HQ's, mas eu amo a Mulher Maravilha, então fico empolgada para conhecer outras versões da personagem.
    beeeeijos
    http://estante-da-ale.blogspot.com/

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