Ao longo da minha vida foram poucas as vezes que meu pai incentivou de alguma forma meu hábito de leitura. Mesmo agora meu Painho, em nossos momentos de atritos ideológicos ataca bastante meus pobres livros, mas um dia em algum momento da minha infância ele presenteou a mim e a meu irmão com uma revista em quadrinhos do Recruta Zero.
Lembro bem daquele momento no qual Painho chegou de alguma das viagens dele, abriu a bolsa e tirou um gibi do Recruta Zero novinho em folha e deu a mim e a meu irmão. Lembro daquela tarde e dos dias seguintes de viver com esse quadrinho na mão até ele praticamente derreter. Ironicamente, não lembro nadinha das histórias. Quando encontrei essa edição velhinha na Banca Guararapes não resisti e trouxe para casa por pura nostalgia.
As histórias são curtinhas, um compilado das tirinhas publicadas no jornal ao longo de um tempo onde são exploradas situações da vida cotidiana em quartel protagonizadas por um soldado preguiçoso, metido a espertalhão e atrapalhado apelidado de "Recruta Zero".
Honestamente o Zero não me encantou, ele me lembrou muito o jeito do Didi, personagem do Renato Aragão, do qual eu também não gostava muito durante a infância. Claramente as esquetes do "Quartel dos Trapalhões" são inspiradas nas tirinhas do Mort Walker. Inclusive o antológico Sargento Pincel lembra muito o Sargento Tainha que vive grudado no pé do Zero sendo enganado por ele, e sendo um homem gordo é constantemente vítima de gordofobia.
Aliás, tem um diálogo ótimo entre o Recruta Zero e o Sargento Tainha sobre as eleições americanas que me fizeram pensar o quanto não é uma novidade na política dos Estados Unidos existirem dois candidatos horríveis disputando a presidência.
Em alguns momentos também aparecem críticas sutis as forças armadas.
Gostei muito especialmente como os generais do exército são retratados através da figura do General Amos Dureza, um idoso careca que se sente muito, mas é só um sujeito prepotente e meio babaca. A Dona Tetê, uma mulher loira dentro dos padrões de beleza, secretária do exército também é ótima, totalmente fora daquele padrão de "bela e burra", muito pelo contrário, ela faz comentários ótimos e cheios de sarcasmo.
A relação da esposa do General Amos Dureza com ele também é ótima. Ela é uma idosa muito sagaz que manda e desmanda no marido, ela envelheceu muito melhor que ele e tem um senso de vingança muito bom.
As tirinhas do Recruta Zero são divertidas, muitas vezes críticas das relações de poder dentro do quartel entre membros de diferentes patentes no batalhão e entre os homens e as mulheres também. É uma leitura leve e fácil, tem uma carga de gordofobia e machismo característico do século XX bem forte. Não é adequado à infância pois debate temas das estruturas sociais mais compreensível a pessoas adultas. Li as tirinhas enquanto fazia o longo caminho de volta para minha casa depois de passar três dias na casa dos meus pais.
ah, eu tenho uma relíquia desse tipo. vou tentar achar pra falar pra vc. beijos, pedrita
ResponderExcluirAgora me dei conta de que não tive nem mesmo esse incentivo para a leitura, por parte do meu pai, rsrs. Eu li muitos gibis na infância, inclusive os do Recruta Zero. Porém, o meu pai não gostava que eu (e meus irmãos e irmãs) "perdêssemos" tempo com isso. Aqui em Brasília tem tipo "um bairro" chamado Setor Militar Urbano que, durante muito tempo, sempre me fazia lembrar das estórias do Zero, todas as vezes em que eu o avistava de longe.
ResponderExcluirBeijo