quinta-feira, 17 de abril de 2025

Os Provérbios de Clarice Lispector


Tenho lido, aos poucos e sem pressa, "Todas as Crônicas" de Clarice Lispector e é um deleite para o coração. Essa Clarice quotidiana, contando detalhes do seu dia-a-dia, se abrindo texto a texto, despretensiosamente sincera, traz uma sensação de intimidade, de não ser sozinha no mundo, de ter uma fonte de pequenas alegrias.
"E que não se esqueça, nessa minha fina luta travada, que o mais difícil de se entender é a alegria. Que eu não esqueça que a subida mais escarpada, a mais à mercê dos ventos, é sorrir de alegria. E que por isso e aqui é que menos tem cabido em mim: a delicadeza infinita da alegria." (PRIMAVERA AO CORRER DA MÁQUINA, Jornal do Brasil, 23 de Setembro de 1967).
Me pego lendo as crônicas no início das manhãs dos meus dias de folga e pouco antes de dormir nos meus dias de trabalho. Pela manhã Clarice e café preto sem açúcar, a noite Clarice com chá de hortelã ou erva-doce: é assim que ando vivendo. Algumas crônicas são longas, outras curtíssimas. Todas me fazem pensar e repensar a forma como existo nesse mundo e me relaciono com os eventos e pessoas próximas e distantes.
"Eu disse a uma amiga:
- A vida sempre superexigiu de mim.
Ela disse:
- Mas lembre-se de que você também superexige da vida.
Sim. 
(SIM, Jornal do Brasil, 21 de Outubro de 1967) 
Às vezes o texto de Clarice Lispector pula do papel como uma revelação, parece algo Bíblico, saído de pergaminhos antigos, tabuletas cuneiformes produzidas nas primeiras cidades ou nos papiros mágicos do Antigo Egito. Falas proverbiais: "Os Provérbios de Clarice Lispector".
"... todo herói é um herói de si mesmo. Quem vence estar-se vencendo." (SAN TIAGO, Jornal do Brasil, 06 de Janeiro de 1968)
Apesar de quem lê Clarice Lispector saber por instinto que ela não foi o tipo de pessoa com pretensão de professar verdades ou construir receitas de viver a vida ou propor preceitos morais, cada nova leitura sinto ela me ensinando a viver e interpretar a vida. Essa Clarice quotidiana das crônicas escrevendo conforme o sabor das suas sensações, das suas noites insones, das suas visões e experiências me impacta a ponto de soar como uma revelação. Sinto quase como quem ler um escrito sagrado. Talvez todas as coisas feitas com sinceridade, humildade e ternura tenham um pouco de sagrado em si.
"Amar aos outros é a única salvação individual que conheço: ninguém estará perdido se der amor e às vezes receber amor em troca." (AS TRÊS EXPERIÊNCIAS, Jornal do Brasil, 11 de Maio de 1968)
Abri esse post com o intuito de transcrever as passagens das crônicas de Clarice Lispector que me impactaram de uma forma proverbial e o texto foi ficando longo, muito longo, longuíssimo, insustentavelmente extenso. Então acabei decidindo criar uma série de postagens chamada "Provérbios de Clarice Lispector" onde pretendo ir postando os trechos que estão me impactando ao longo do exercício de leitura de "Todas as Crônicas".
"Morri de muitas mortes e mantê-las-ei em segredo até que a morte do corpo venha, e alguém, adivinhando, diga: esta, esta viveu.
Porque aquele que mais experimenta o martírio é dele que se poderá dizer: este, sim, este viveu." (MORTE DE UMA BALEIA, Jornal do Brasil, 17 de Agosto de 1968)

Desculpem se esse blog tem andando com excesso de Clarice Lispector, é que ela é a grande descoberta dessa minha vida Balzaquiana, talvez a grande herança que levarei para a próxima, possivelmente longa e profundamente assustadora, fase dos ENTA que, logo menos a frente, me espera.

3 comentários:

  1. ah, clarice nunca cansa. beijos, pedrita

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  2. Ela era uma gênia!!!! Tenha uma linda Páscoa. bjssss

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  3. Oi Pandora! Eu nunca li Clarice, mas sinto que a conheço um pouco lendo suas postagens. Fico feliz que você tenha encontrado essa leitura que tanto lhe agrada.
    Bjos!!
    Moonlight Books

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