domingo, 18 de agosto de 2024

"Longe Deste Insensato Mundo" de Thomas Hardy


Comecei a ler literatura do século XIX ainda na adolescência, especialmente os romances, e se naquela época já era um deleite para minha imaginação e um espaço de sonhos fofos, hoje é meu refúgio, meu lugar quentinho. Acho uma delícia, poucas coisas alinham tão bem meus chakras quanto um bom livro escrito no século XIX, talvez por isso minha amiga Aldi me emprestou "Longe Deste Insensato Mundo" e eu amei.
 
Através da narrativa do Thomas Hardy fui levada a vida rural da Inglaterra Vitoriana, para uma realidade permeada por pequenos vilarejos, grandes pastos de ovelhas, plantações de trigo e pessoas simples, vivendo vidas modestas, ocupadas de seus trabalhos cotidianos, na criação de ovelhas, no plantio e colheita da lavoura, nas idas e vindas a Igreja Anglicana aos domingos. Cenários bucólicos, trama baseada nos sentimentos, nas paixões que dão ou não certo e marcam para sempre os corações e mentes das pessoas que ocuparam tanto o lugar de protagonista quanto os coadjuvantes.

A história de "Longe Deste Insensato Mundo" é protagonizada por Gabriel Oak, um pastor austero de ovelhas que por um golpe de má sorte perde todo seu rebanho e precisa procurar um emprego em alguma fazenda da região onde mora; e Bathsheba Everdene, uma mulher tempestuosa e cheia de personalidade que torna-se herdeira de uma propriedade rural e decide ela mesma administrar seus bens usando sua inteligência e presença de espírito.

Bathsheba e Gabriel Oak são pessoas de temperamentos distintos. Ele é muito austero e calcula cada passo a ser dado com frieza e senso de responsabilidade. Ela é intempestiva e passional, age duas vezes antes de pensar, banca todas as suas apostas, as vezes perde. Ambos são pessoas brilhantes e inteligentes, cativantes, seu primeiro encontro acontece quando Oak ainda está na posição de pastor de ovelhas com rebanho próprio e boa possibilidade de crescer na vida e Bathsheba ainda não havia herdado nada. Desde o primeiro encontro do casal, me vi amando, torcendo por eles, mas a vida deu uma volta, e um perde tudo enquanto a outra ganha, os dois se desencontram e depois se reencontram com o Gabriel se tornando empregado da então Srtª Everden, proprietária de terras e animais.

Para quem conhece a narrativa bíblica só vê o nome Bathsheba já se sabe que estaremos diante de uma história de paixão, afinal esse é o nome da esposa de Urias, um dos soldados do mitológico Rei Davi. Na narrativa bíblica o Rei Davi ao vê a Bathsheba se banhando arde de desejo por ela e leva "ao fim e ao cabo" sua paixão. Quando sua amada aparece grávida ele trama para que Urias se torne mais um soldado morto em guerra e desposa ela. Quem quiser saber com mais detalhes essa história toda pode consultar a Bíblia no livro 2 Samuel, capítulo 11, versículos do 1 ao 27. Trata-se de uma das histórias mais tórridas contadas no Velho Testamento, foi o motivo da minha primeira decepção com homens. Davi foi tanto meu primeiro "Príncipe Encantado" quanto "Boy Lixo".

Assim como a personagem bíblica, a protagonista de "Longe Deste Insensato Mundo", com sua beleza, temperamento e posição social, desperta o amor não só do Gabriel Oak, mas dos outros homens relevantes de sua comunidade: o rico e respeitável proprietário de terras, Srº Boldwood, e o sedutor Sargento Troy. Nossa protagonista caminha entre a razão e a emoção e se deixa seduzir e encantar pelos golpes do amor mais clichês da vida, o tempo todo nós ficamos com o coração na mão vendo a tragédia se desenrolar.

Esse romance daria uma excelente novela com a protagonista tomando decisões equivocadas, vivendo altos e baixos com grandes curvas dramáticas. Tive alguma dificuldade com a tradução da Pedrazul, porém da metade para o fim do livro não conseguia largar mais tantas eram as emoções vividas em cada capítulo. A paixão às vezes nos guia por trilhas muito difíceis, faz com que nossas vidas se tornem uma montanha russa e quando os autores e autoras conseguem trazer esse tipo de experiência para as páginas de um livro é maravilhoso.

Bathsheba faz escolhas seguindo os seus desejos, sofre as consequências, se descontrola, perde o senso, vive situações escabrosas. É uma mulher vivendo altos e baixos. Gabriel Oak tem o mérito de ter permanecido junto a ela como um ombro amigo, pessoa ajudadora, coadjuvante dos processos de sua amada. Boatos de que na época do lançamento do livro as leitoras todas se apaixonaram por ele e não duvido, pois lendo mais de centena de anos depois do lançamento me apaixonei igual.

Hardy, como homem de seu tempo, tem uma visão das ações de sua protagonista muito diferente da minha. O fato de alguns traírem a confiança de uma mulher apaixonada não torna automaticamente errado agir com honestidade, seguindo nossas paixões, sem a intenção de prejudicar alguém. Achei delicioso acompanhar uma mulher altiva tentando ser dona e mestra de sua vida, de seus bens, de seu destino e do seu desejo. A conclusão do livro também foi deliciosa, esperei o pior durante algum tempo, mas fui premiada com um final muito doce e romântico.

3 comentários:

  1. eu vi o filme baseado nesse livro, ela foi interpretada por julie christie. preciso ler o livro. https://mataharie007.blogspot.com/2015/05/far-from-madding-crowd.html beijos, pedrita

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  2. De Thomas Hardy eu conheço pouco (apenas Judas, o obscuro). Mas eu quero ler outras obras dele, que é um maravilhoso escritor que, ainda por cima, parece ter um grande interesse nas histórias bíblicas. Por falar nisso, a história do rei Davi tem me fascinado há anos. De vez em quando em me pego refletindo sobre a vida desse rei que, mesmo sendo sinceramente temente a Deus, caiu em tentações e falhou mais de uma vez.
    Mas Davi também enfrentou provas duríssimas, como, por exemplo, o comportamento claramente competitivo, de seu filho, Absalão e, principalmente, amargou a conspiração levada a cabo por esse filho, que acabou morto, para desespero do rei. Enfim, acho que a história de Davi nos ensina muita coisa, se estivermos preparados para as perceber.

    Beijo

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  3. Oie! Essa capa é tão imponente!
    Belo post, adorei.
    Beijo, beijo

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