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quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Aventuras de Alice no País das Maravilhas e Através do Espelho e o que Alice encontrou por lá

Alguns livros são tão incríveis e exercem sobre nós um fascínio tão grande que uma leitura não basta. É como se eles tivesse voz e desejos próprios e de tempo em tempo simplesmente nos chamam para voltar e desesperadamente precisamos ir lá e reler por pura necessidade existencial.


"Aventuras de Alice no País das Maravilhas" e "Através do Espelho e o que Alice encontrou por lá" se encontra entre os livros que mais tenho relido nos últimos 15 anos e por incrível que pareça sempre me pego achando uma coisa diferente da que achei antes. Invariavelmente tenho concluído a leitura do texto do Lewis Carroll dizendo: "Agora eu entendi a história!", para depois de 2, 3 ou 5 anos reler e dizer: "Nossa! Como isso estava aqui e eu não vi?".


Não sei se os livros são possuidores do dom da transmutação ou se as pessoas se transformam através dos anos, talvez sejam os dois, livros e humanos, seres em constante processo de mutação. Quando mergulhei com Alice na "Toca do Coelho" rumo ao "País das Maravilhas" e "Através do Espelho" pela primeira vez senti uma aflição terrível. Tudo nos livros tinha tons de pesadelo, ninguém parecia dizer coisa com coisa, todos respondiam com perguntas... Nossa, quão grande foi meu alivio quando vi a menina acordar! Me senti acordando com e ela e decidi voltar a ler novamente sem a aflição de não saber se aquilo era real ou não.

Incrível como a gente se engana nessa vida! Viajar pelo Mundo das Maravilhas e Através do Espelho sem aflição não existe e não teria a minima graça. Se for para não me sentir aflita com as questões existenciais propostas pelos personagens é melhor nem ir.

Essa nova leitura da obra de Lewis Carroll colocou em grande evidencia para mim o quanto ele era critico a uma educação escolar meramente informativa. Enquanto cai na "Toca do Coelho" Alice tenta rememorar as coisas aprendidas na escola, informações enciclopédicas empurradas nela goela adentro, e mostra o quanto tentou digerir tudo e quão poucos resultados trouxeram esse esforço. Indo de encontro a forma como a educação infantil funcionava em meados do século XIX os habitantes do "País das Maravilhas" não empurram em Alice formulas e informações prontas, eles questionam, instigam e empurram a menina para o caminho da experiência.

Geralmente quando temos uma criança sob nossa tutela a sanidade nos leva a oferecer a ela orientações muito precisas, baseadas em nossas experiencias, de como ela deve agir ou não para obter sucesso. Porém, as pessoas com as quais Alice se encontra no mundo além da "Toca do Coelho" são loucas, elas não tem resposta nem para suas próprias charadas quanto mais para as da menina! Para aprender ela precisa encontrar pessoas, experimentar, caminhar, desbravar, ouvir, falar, correr, recitar as poesias...


Também é imperativo falar dos encontros da menina com os habitantes do estranho mundo no qual ela cai. A começar pela exótica Lagarta com seu narguilé que não pergunta: "Qual seu nome?", mas "Quem é você?". Em um dia normal essa já não é uma pergunta das melhores, imagina em um dia no qual você diminuiu, cresceu, falou com animais, foi confundida com outra pessoa, foi pra lá e pra cá meio sem rumo em um lugar desconhecido? Difícil! Alice se enerva, quer ir embora, da meia-volta, MAS a Lagarta não deixa:
"Volte!"chamou a Lagarta. "Tenho uma coisa importante para dizer!"
 A menina se vira e volta para ouvir:
"Controle-se", disse a Lagarta.
Já perdi as contas de quantas vezes na vida precisei me controlar para encontrar alguma ajuda para um problema difícil. No entanto, quando a Lagarta disse isso, fiquei na duvida entre chorar ou rir. Gente, isso é trolagem pura! Todos os outros encontros da criança parecem ser pontuados por esse tipo de sacanagem

Na frente da casa da Duquesa, Alice pergunta ao Lacaio: "Como faço para entrar?". O danado simplesmente tasca nela um: "Mas, afinal, você deve entrar? Essa é a primeira pergunta." Ela se irrita, resmunga e tudo e tal e pergunta: "Mas o que devo fazer?". Ao que ele responde: "O que quiser...". Junto com o fabuloso Gato de Cheshire, com o querido Chapeleiro Maluco, a Lebre de Março, o Lacaio com cara de sapo está no roll dos meus personagens favoritos.


Ainda sobre o roll dos personagens favoritos preciso reafirmar o quanto acho sensacional o dialogo de Alice com o Bichano de Cheshire:
"Poderia me dizer, por favor, que caminho devo tomar para ir embora daqui?"
"Depende bastante de para onde quer ir", respondeu o Gato.
"Não me importa muito para onde", disse Alice.
"Então não importa que caminho tome", disse o Gato.
"Contanto que eu chegue a algum lugar", Alice acrescentou a guisa de explicação.
"Oh, isso você certamente vai conseguir", afirmou o Gato, "desde que ande o bastante." (pag. 76/77)
Novamente não sei se é para rir ou chorar... Depois dessa só posso deixar registrado que o esforço da minha vida consiste em andar o bastante.

E o que fazer quando a gente escuta/ler o Chapeleiro falando do Tempo?
"Se você conhecesse o Tempo tão bem quanto eu falaria dele com mais respeito." (pag. 84)
Estou a trinta anos convivendo com o Tempo e cada ano tenho por ele mais respeito. Ele não é linear, constante ou medido tão facilmente quanto o relógio comum faz supor que seja. É conveniente acreditar que um dia tem 24 horas e um ano 365 dias, mas quem viveu suficiente sabe o quanto há anos que não cabem em um dia e dias que não cabem em um ano. Há eternidades que acabam em segundos e segundos que duram uma eternidade.


Apesar de ter a impressão de todos os habitantes do País das Maravilhas serem confusos e pouco dado a respostas fáceis, também tenho a sensação de não existir um senso de perigo no mundo abaixo da Toca do Coelho ou uma urgência na viagem feita pela menina. Bem diferente da trajetória dela "Através do Espelho", durante essa leitura se impregnou em mim uma sensação de insegurança profunda.


No "Outro Lado do Espero" a criança mais obtêm ajuda, pessoas para caminhar com ela e menos perguntas isso tudo parece existir para equilibrar um perigo real sempre a espreita. Alice parece correr o risco constante de se perder até mesmo de si mesma. Lembrei muito do mundo do "Outro Lado da Muralha" criado por Neil Gaiman que aparece em obras como "Stardust: o mistério da estrela" e "Os livros da magia" entre outros. No mundo invertido do espelho é possível encontrar personagens lendárias tradicionais saídos do folclore inglês seus contos populares, poesias e canções. Ela ainda precisa entrar na floresta e enfrentar trilhas perigosas para sua memória e identidade.


Gosto muito das considerações da Rainha Vermelha:
"... você tem que correr o mais que pode para continuar no mesmo lugar. Se quiser ir a alguma outra parte, tem de correr no mínimo duas vezes mais rápido!" (pag. 186).
"... lembre-se de quem você é." ( pág. 188)
Só Deus sabe o quanto uma vez dentro de uma floresta pode ser fácil esquecer quem se é ou seder a tentação se deixar seduzir pessoas e situações prontas a nos levar a esquecer nosso nome, origem, desejos e sonhos. Existe alguém que vez ou outra não foi convidado a barganhar qualquer parte de si em troca de uma ninharia e precisou se agarrar em um amigo tal como Alice se agarrou na Corsa para atravessar o bosque "em que as coisas não tem nome"?

E se eu gostei da Rainha Vermelha novamente me apaixonei pela generosa Rainha Branca. Quando Alice se desespera ela não oferece consolos vãos, doces ou ilusões, simplesmente diz:
"Considere a menina grande que você é. Considere a longa distância que percorreu hoje. Considere que horas são..." (pág. 227)
Não é sem motivos que o Gato questiona Alice em relação a quem ela é. De muitas formas, em momentos de desespero, o que nos salva é a possibilidade de considerarmos quem somos. Aliás, também acho delicioso o fato da Rainha Branca colocar em evidencia a distância percorrida, até mesmo as horas.


Desse encontro também destaco as coisas faladas a respeito de acreditar no impossível:
Alice riu. "Não adianta tentar", disse; "não se pode acreditar em coisas impossíveis.""Com certeza não tem muita prática", disse a Rainha. "Quando eu era da sua idade, sempre praticava meia hora por dia. Ora algumas vezes cheguei a acreditar em até seis coisas impossíveis antes do café da manhã..." (pág. 227/228)
Sei o quanto esse texto já está quilométrico, mas ainda gostaria de destacar o encontro da Alice com a Ovelha e o Unicórnio, pois ambos disseram coisas sobre as quais me pego pensando com constância.
"Pode olhar para a sua frente, e para os dois lados, se quiser", disse a Ovelha, "mas não pode olhar para tudo a sua voltar... a menos que tenha olhos na nuca." (pág. 230).
"Bem, agora que nos vimos um ao outro", disse o Unicórnio, "se acreditar em mim, vou acreditar em você..." (pág. 264).
Por todos os motivos aqui citados, e outros tantos não citados, só posso concluir esse texto gigantesco reafirmando meu amor pela obra de Lewis Carroll e meu desejo de continuar sendo um pouco Alice na vida. Ainda quero forças para consegui seguir o Coelho Branco, mergulhar na toca, chegar um mundo de maravilhas ou encontrar uma forma de ir através do Espelho para um mundo invertido perigoso mas cheio de pessoas generosas capazes de ajudar qualquer um a acreditar em si, no seu nome e na possibilidade do impossível.

Ah, fiz a releitura desse clássico em conjunto com o Alexandre do blog #DoQueEuLeio. Clique AQUI para conferir a resenha dele, bem mais sintética que a minha.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

O mágico de Oz de L. Frank Baum


Eu lembro das circunstancias nas quais "O mágico de Oz" me foi apresentado. Foi em uma apresentação de trabalho na escola durante o 2º ano do Ensino Médio. Uma das minha colegas de turma leu e apresentou a sala a leitura em uma tarde assim como essa, em pé no lado direito da sala. A apresentação foi legal, eu fiquei com vontade de ler o livro, li, o tempo passou e de repente senti vontade de  caminhar novamente pela estrada de tijolos amarelos com Dorothy, o Espantalho, o Homem de Lata e o Leão Covarde. Foi como se Oz estivesse me chamando de volta e eu voltei!


Foi maravilhoso encontrar novamente a Dorothy e o seu cachorrinho Totó e viver com ela sua jornada mágica na Terra de Oz onde espantalhos ganham vida, leões falam e homens feitos de carne e sangue podem se transformar em homens de lata... Uma terra na qual não existem fadas, apenas bruxas que podem ser boas ou más, mas sempre são poderosas e o único mago é um farsante, não por escolha própria, mas por imposição cultural, afinal as pessoas pedem a Oz o impossível e como conseguir o impossível sem um pouco de imaginação e muito de farsa?!?!

Toda a história de Dorothy e do seu cachorro Totó começa quando um tufão arranca a casa na qual ela vive com tia sua amada tia Em e seu tio Henry no meio do Texas e a leva para a Terra de Oz onde ela aterriza em cima de uma bruxa má da qual só sobra um par de sapatos prateados que passa a pertencer a menina. Depois disso começa sua jornada, ninguém sabe como ela pode voltar para casa, então dizem a ela para procurar o "Grande e Terrível Mágico Oz" na maravilhosa "Cidade das Esmeraldas" na qual ela vai chegar se caminha pela estrada de tijolos amarelos.


Sem muita demora a menina se arruma e se lança em sua aventura e vai ao longo do caminho encontrando os seus lendários companheiros de caminhada:

O Espantalho que deseja desesperadamente um cérebro com o qual possa pensar!


O Homem de Lata, que deseja desesperadamente um coração com o qual possa amar!


E um Leão medroso que deseja desesperadamente uma dose de coragem com a qual possa enfrentar a vida na selva com os outros animais sem está continuamente os espantando.


Juntos eles vão caminhando pela estrada e enfrentando os desafios oferecidos por ela como: buracos, rios, precipícios, plantas venenosas. Fica claro que sozinho nenhum dos cinco conseguiria ir muito longe, mas juntos eles conseguem vencer os desafios impostos pela natureza e por incrível que pareça o Espantalho demonstra ser bem inteligente, o Homem de Lata ter um coração imenso e o Leão uma incrível capacidade de enfrentar seus medos quando precisa ajudar seus amigos.


Quem não prometia nada e subestimava suas habilidades mostra-se capaz de enfrentar e vencer desafios, já quem prometia muito como o Poderoso Mágico Oz... Bem, não vou dar spoilers, vai que alguém ainda não leu.

Sobre o autor, preciso dizer que L. Frank Baum em um segunda leitura se mostrou ainda melhor que na primeira. O seu texto é claro, descritivo e mágico, ele nos leva para esse outro mundo mágico e nos prende. Também é encantador perceber o quanto o texto não é pedagogizante. Tudo em "O mágico de Oz" é lúdico e se a história de Dorothy, Totó, Espantalho, Homem de Lata e Leão Covarde tem uma lição para os leitores isso quem ler vai descobrir sozinho, através de sua capacidade de interpretar o texto.

Talvez um dos motivos pelos quais esse livro se tornou um clássico infantil seja o fato de que o autor não comete o crime literário de duvidar da capacidade infantil de compreender as entrelinhas. E como há entrelinhas no texto de Frank Baum! 

"O magico de Oz" me convidou a pensar como costumamos duvidar da nossa capacidade, como muitas vezes esperamos encontrar em alguém ou algo uma resposta que já existe em nós... Também me lembrou que amizade é algo que se constrói enquanto caminhamos e algumas permanecem apenas por alguns instantes e outras pela jornada inteira. Me fez pensar que de vez em quando é normal sair da estrada, adormecer no caminho, se perder, mas nesses momentos, caso a gente queira voltar para casa, é preciso voltar a estrada e seguir até a Cidade das Esmeraldas e além dela. Não por acaso existe adaptações e mais adaptações desses clássico.


Adoro o musical de de 1939, Judy Garland, Frank Morgan, Ray Bolger, Jack Haley, Bert Lahr, Billie Burke e Margaret Hamilton. Não canso de rever e me encantar com as músicas e de me sentir arrebatada pela interpretação dos atores. A hq publicada pela Editora Farol também é bem fofa, uma adaptação bem fiel a obra original.

Ah, antes que esqueça, preciso dizer que amei ler edição de bolso da Zahar, ela é pequena, cabe na minha mão direitinho e tem as ilustrações originais... me deu uma sensação de ter voltado no tempo... 

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Manter a cabeça erguida: da minha rotina e do que eu tento fazer...

Sexta-feira é um dia meio ressacado pra mim, sempre parece que eu bebi uma boa cachaça a semana inteira ou simplesmente passei a segunda e a terna enfurnada no arquivo e a quarta e a quinta enfurnada na universidade, então acordo meio dolorida... É meu dia oficial de descanso, de assistir anime, de dormir até tarde...

Os fins de semana eu guardo para colocar as leituras em dia, fichar meus textos, organizar a semana... Mas, não é apenas de minha rotina que eu gostaria de postar hoje, embora pense que valha a pena registrar esses dias em que estou aprendendo a ser historiadora.

Eu também gostaria de deixar por aqui, a poesia que remexeu meus pensamentos durante toda a semana com seu convite a manter a cabeça erguida e olhar adiante. Algo decididamente muito difícil de se fazer, uma vez que a coluna as vezes reclama e as pernas latejam, mas suponho que viver em pé é sempre melhor que rastejando e quem vive de cabeça erguida pode ver o mar, o sol e as possibilidades adiante!



"ERGUER A CABEÇA ACIMA DO REBANHO"

Erguer a cabeça acima do rebanho
é um risco
que alguns insolentes correm.

Mais fácil e costumeiro
seria olhar para as gramíneas
como a habitudinária manada.

Mas alguns erguem a cabeça
olham em torno
e percebem de onde vem o lobo.

O rebanho depende de um olhar.
__________

P.S.: Tita, obrigada por ter compartilhado a poesia comigo e me apresentado o autor!