domingo, 29 de maio de 2022

"O Céu da Meia-Noite" de Lily Brooks-Dalton


Fazia muito tempo desde que eu tinha pego um livro de ficção científica para ler, então olhando minha coleção de livros da Tag Curadoria vi "O Céu da Meia-Noite" da Lily Brooks-Dalton e senti o chamado da aventura.

A história do livro começa em um futuro não muito distante do nosso presente no qual alguma coisa aconteceu com a humanidade, talvez uma guerra, não sabemos, pois o livro não explica nada sobre isso, mas esse algo foi letal para todos os sistemas de comunicação atualmente existentes. Internet, eletricidade, estações de rádio e TV, nada mais funciona e não sabemos se mesmo a humanidade sobreviveu ao que quer que tenha acontecido.

Nesse futuro de desconexão, encontramos Augustine, cientista brilhante com uma carreira de pesquisa extensa e bem sucedida, isolado no Ártico Canadense, e Sullivan, tripulante da espaçonave Aether, voltando para a Terra depois de uma missão até as luas de Júpiter. A narrativa do livro é em terceira pessoa, mas acompanhamos estritamente a jornada desses dois personagens nesse "Depois do Fim do Mundo" e, assim como é para eles, é difícil para nós saber o que houve com a Terra, se ainda existem seres humanos no mundo e quais foram os fatores determinantes para o silenciamento de todas as formas de comunicação possíveis entre os seres humanos. Como aos personagens, só nos resta encarar a jornada de Sullivan de volta à Terra e a de Augustine no Ártico.

Está na companhia de Augustine e Sullivan nesse momento depois do fim do mundo como conhecemos acabou se tornando uma experiência muito reflexiva. Diante da solidão de uma viagem pelo Sistema Solar e da permanência nas Geleiras Eternas, os personagens enfrentam a companhia de suas lembranças do passado, caminham pelas escolhas que fizeram até o momento no qual estão isolados e desconectados de suas famílias. Diante da ausência de uma perspectiva de reencontro com entes queridos, eles esquadrinham o passado em busca de erros, acertos, medos, conquistas, perdas, revisitam as memórias de uma vida inteira.

Esse é um livro sobre pessoas desconectadas de qualquer forma de comunicação com o resto do mundo, sobre a solidão e a necessidade de se conectar com algo, ancorar nossa capacidade de afeto em alguma coisa. Na solidão da minha casa, ler esse livro me fez pensar muito na minha família, sonhar ainda mais com os sons da casa dos meus pais quando éramos os cinco morando juntos. Me comoveu muito conhecer a história familiar de Sullivan, filha de uma mãe solo, ela passou os primeiros anos da vida acompanhando a mãe em seus ambientes de pesquisa. Ironicamente na solidão das imensas esperas pela atenção da mãe, ela se sentia mais conectada à mãe do que quando a mãe dela deixou de ser cientista, arrumou um marido e teve mais filhos. Já o Augustine me deu pena! Mergulhei na história dele e descobri o tipo de homem deplorável que ele foi, mas ao descobrir o contexto familiar responsável por o tornar essa pessoa atroz, contemplar seu final solitário me fez sentir pena.

Na solidão do Ártico, do qual Augustine com setenta e muito anos sabe que jamais sairá, ele encontra uma menina, Íris, o tempo todo me perguntei se ela era real ou imaginária, no entanto, o mais interessante para mim foi vê como um homem tão desconectado de tudo e todos se vê interagindo com uma criança e amando ela. É tocante! É tentador supor que todos os seres humanos no centro do seu ser anseiam e desejam por conexão, por da e receber ternura, por encontrar alguém a quem amar e de quem receber amor.

Na astronave, Sullivan convive com uma equipe a quem a falta de contato com a Terra afeta de diferentes formas gerando depressão, estresse ou firme apego ao momento presente. A gente vai navegando pelas memórias dela, conhecendo a mãe dela, a filha e o marido Jack. É muito irritante vê como as estruturas de uma sociedade machista foram eficientes em desconectar a Sullivan de sua filha. O amor ferrenho da astronauta por sua profissão e seu sonho de navegar pelo espaço não foi compreendido por seu marido que reagiu com afastamento, divorcio e por fim conduzindo a situação de maneira a tornar ela uma estranha para a sua filha. Muito antes da conexão com a Terra ser definitivamente cancelada, ela já estava desconectada da sua família, o contrário do que aconteceu com os tripulantes homens cujas famílias permaneceram apoiando por todo o tempo que antecedeu ao fim.

A narrativa de Lily Brooks-Dalton é muito lenta e o livro tem pouquíssimos momentos de ação e tensão. Aqui temos mais uma trama reflexiva, sobre solidão e memórias familiares. "O céu da meia noite" me fez refletir sobre os acontecimentos e escolhas responsáveis por criar e desfazer conexões entre as pessoas das quais sou próxima e das quais sou distante. O livro não é arrebatador, mas é comovente, paciente, tem um final aberto e, apesar de ter me feito chorar em vários momentos, me fez da risada no final. Achei muito divertido o fato da autora não ter resistido a tentação de criar uma conexão tão absurdamente clichê que, na minha opinião, chega a ser corajoso da parte dela ter colocado ali.

3 comentários:

  1. linda capa, não conhecia. beijos, pedrita

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  2. Ah nossa, eu tenho esse livro, mas não li porque a TAG falou que dava ressaca literária kkk foi numa época que eu queria só ler livro infantil. Obrigada pela resenha vou dar uma chance a ele agora. Beijos!

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  3. Fiquei com sentimentos bem ambíguos sobre esse livro. Achei a temática muito boa, mas não curti muito a execução. Gostei de como as relações se estabelecem, mas não gostei do final... rs Doideira, né??

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