Em 2017 postei no Instagram uma daquelas fotos de uma pilha de livros a serem lidos e a Ursula K. Le Guin estava lá em baixoooo. Então a Ada Chivers comentou
"A mão esquerda da escuridão não deveria está tão lá em baixo, só dizendo..."
No livro se conta a história de como Genly Ai se ver, por opção própria, na qualidade de enviado a Gethen, um planeta mergulhado até as raízes em uma Era Glacial rigorosíssima, para propor a população nativa que integre o Ekumen, um conselho formado por vários planetas ocupados por seres humanos. Até a chegada de Ai Getren desconhecia totalmente a existência de vida alienígena, mas a população do planeta não é necessariamente hostil com ele. A questão é que aos poucos ele se vê no meio de uma intricada trama politica que em muitos aspectos ele nem mesmo sonha está acontecendo.
Enquanto a trama ocorre e Genly Ai faz tudo para cumprir sua missão e encontrar a aceitação dos governantes de Gethen a sua proposta nós conhecemos junto com ele a religião, a cultura e até mesmo a biologia dos nativos do planeta Inverno cuja peculiaridade maior é serem humanos completamente andrógenos que só assumem o papel de macho e fêmea durante seu período fértil para fins reprodutórios. Fora do período fértil os genthenianos não são nem homens e nem mulheres são apenas humanos vivendo suas vidas com a total ausência de distinções de gênero.
Compreender a sutileza da forma como religião, regras sociais, politica e economia se desenvolve nesse contexto me pareceu ter sido o maior desafio de Genly Ai, de desarmar de seus preconceitos, limpar seus olhos e se abrir a percepção daquele estilo de vida foi a maior dificuldade do enviado e também a minha. Quando me vi junto com Ai no "Lugar Dentro da Nevasca" e a ficha finalmente caiu em relação ao mundo e as pessoas as quais a Ursula K. Le Guin estava me apresentando foi um impacto, uma dor, uma revelação, chorei diante de um presente generoso, aguardado e imerecido.
Nusuth. "O admirável é inexplicável" (pg. 83)
Estou escrevendo aqui só para dizer o quanto foi um um prazer temer e amar um mundo frio, quase inóspito e tão generoso como Gethen. Ainda estou impactada pela honra inestimável de ter podido desconfiar, temer, sofrer, me apaixonar e por fim amar por um personagem tão complexo, imenso e completo como Therem Harth rem ir Estraven que não é ele ou ela e sendo naturalmente os dois existe apenas como um ser humano.
Estraven e Genly Ai |
E claro, nesses dias nos quais eu aprendo a viver sem criar grandes expectativas, grandes planos secretos, castelos no ar, tal como Genly Ai em sua missão dando um passo de cada vez foi muito agradável encontrar no meio de uma floresta gelada a sabedoria de genthenianos como Faxe:
"O desconhecido - disse a voz suave de Faxe na floresta - o não previsto, o não provado: é nisso que se baseia a vida. A ignorância é a base do pensamento. A não-prova é a base da ação. Se não houvesse certeza de que Deus não existe, não haveria religião. Nem Handdara, nem Yomesh, nada. Mas também, se houvesse certeza de que Deus existe, não haveria religião... Diga-me, Genry, o que sabemos? O que é certo, previsível, inevitável... a única certeza que você tem sobre seu futuro, e o meu?
- Que vamos morrer.
- Sim. Só existe realmente uma pergunta que pode ser respondida Genry, e já sabemos a resposta... A única coisa que torna a vida possível é a incerteza permanente e intolerável: não saber o que vem depois."
Ah, por fim, meu muito obrigada a Ada do @SoterradaporLivros por me incentivar a ler "A mão esquerda da escuridão"que também é o livro de Fevereiro do desafio #LendoScifi por ela em parceria com @ogafanhototornase.
ah, nossa, eu tb apressaria a leitura. comigo acontece de eu ter um livro, aqui eu tenho uma estante a ler, e eu ver uma pessoa lendo e aí eu quero ler tb. fiquei curiosa com esse. beijos, pedrita
ResponderExcluirEu li esse livro ha uns trinta anos e ele é atualíssimo! Na época o encontrei meio perdido em meio a Coleção Argonauta (da qual não fazia parte).
ResponderExcluirAinda tenho a versão em epub e já reli sei lá quantas vezes.
Já fiz (e ainda faço) apologia ao modo de vida biológico de Gethen.
Seria maravilhoso (ou será. Quem sabe), se fôssemos daquele modo. Sem gêneros que não o Humano, sem a solidão dolorida que nos leva a procurar tão doidamente no corpo do outro a completitude perdida. Que inveja daquele povo.
Um livro lindo, Pan!
Vai valer todas as revisitas que você fizer a ele nos anos vindouros;
Olá, Pandora.
ResponderExcluirEu não conhecia esse livro ainda. O enredo me pareceu ser bem interessante e desafiador. Quando li Todo Dia já tive bastante dificuldade de não ter uma definição de gênero no protagonista. Eu tenho um livro da autora aqui na minha estante, o Feiticeiro de Terramar, mas ainda não li ele.
Prefácio
Oi, Jaci!
ResponderExcluirMulher, eu não sabia que esse livro era tão antigo assim hahahahahha Faz tempo que ele circula na TBR. Um dia eu leio...
Beijos
Balaio de Babados