quinta-feira, 22 de julho de 2021

A Igreja Matriz de Santo Antônio, no Recife

O centro do Recife guarda algumas igrejas barrocas, nobres sobreviventes dos projetos modernizadores do inicio do Século XX responsáveis por destruir o patrimônio histórico para construir avenidas que partem de "Lugar Nenhum e vão para "Nenhum Lugar". Antes do Covid 19 eu gostava muito de vagar pelo Centro do Recife visitando essas Igrejas, as vezes saia de casa só para isso. As Igrejas Barrocas são obras de arte de paredes largas e portas abertas nos transportam do presente para o passado, de um mundo mais material para um mundo de fé e esperança de perdão e passe livre para o Paraiso depois das dores dessa existência.

Não sou cristã católica, mas frequento as Igrejas do Recife por uma mistura de bairrismo e gosto pela arte. Devido a Pandemia do Covid 19 e o fato de estar morando com meus pais em Igarassu desde março de 2020, fazia tempo que eu via as velhas igrejas barrocas do centro do Recife, fazia mais de ano que não entrava nesse território sagrado. Foi uma emoção reencontrar a Matriz de Santo Antônio. Essa velha igreja é para mim uma velha amiga, não foram poucas vezes que me refugiei nela buscando um alivio para o calor, o sentimento de impotência, a insegurança no mundo, o cansaço físico e emocional de existir em um mundo como o nosso.

Santo Antônio é uma igreja idosa, uma sobrevivente, para os meus sentidos ela sempre transpira paciência. Só para ser erguida ela demandou trinta e sete anos de trabalho, começou a ser construída em 1753 e foi concluída em 1790. Reza a lenda, mentira é o site do IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), que ela foi construída no local onde os holandeses quando ocuparam o Nordeste do Brasil, e transforam Recife em uma cidade propriamente dita, construíram suas trincheiras e sua Casa de Pólvora.

Ela foi construída pela Irmandade do Santíssimo Sacramento, só para constar, as irmandades são instituições religiosas compostas por pessoas comuns, católicas, com o objetivo de ajuda mutua. No período colonial pessoas livres, escravizadas e libertas criavam irmandades com a sanção da Igreja Católica para se organizarem, se apoiarem, exercerem poder dentro da sociedade. Para mostrar quão influentes, poderosos, resistentes os membros de uma Irmandade eram, elas organizavam festas, construíam igrejas, mandavam erguer altares em igrejas existentes, compravam imagens de pessoas santas ou roupas para as imagens das igrejas locais.

A Irmandade do Santíssimo Sacramento é antiga, data da Idade Média, e nela congregavam (talvez ainda congreguem) pessoas poderosas dos dois lados do Oceano Atlântico, hoje, possivelmente, pessoas do mundo todo devem pertencer a essa irmandade. Erguer esse tipo de monumento no século XVIII não era apenas questão de religiosidade ou devoção, era (talvez ainda seja) questão de mostrar poder e influencia. Ter consciência das intensões pouco devotas de quem patrocinou a construção desse monumento, não reduz minha capacidade de apreciar a beleza dele, pois penso não só nos patrocinadores como também nos construtores e nas muitas pessoas que passaram por esse prédio.

Penso nas muitas pessoas que pararam e param diante de Nossa Senhora da Piedade para fazer suas preces e também na sensibilidade e delicadeza dos artistas que levaram dias, meses construindo do altar detalhadamente ao olhar sofrido de uma mãe chorando por seu filho, pedindo a Deus misericórdia. Quantas mães hoje em dia não perderam seus filhos de forma trágica como Maria?


Na parte interna do lado direito da Matriz tem um Ossuário com uns 700 jazigos, memória de um tempo no qual as pessoas acreditavam que quanto mais próximas da igreja as pessoas fossem enterradas melhor para ela no pós-vida. Tem até uma Caixa das Almas, memória da Inquisição, das indulgencias e da ideia de quem "assim que a moeda no cofre cai, a alma do purgatório sai". Hoje acho que é só um lugar para as pessoas botarem sua colaboração para a missa das almas.


Reza a lenda que descansam nesse Ossuário os corpos decepados dos insurretos da Revolução Pernambucana de 1817 e realmente tem muitas pessoas brancas, ricas que fizeram coisas horrendas entre "enterradas" do lado dessa igreja como de tantas outras no Recife e por todo mundo que foi tocado pelos Europeus durante a Idade Moderna e depois dela também.


Um prédio assim guarda muitas histórias, muita feiura encrustada na beleza, muita beleza encrustada na feiura. Eu acho Santo Antônia bonita do chão ao teto, passando altar-mor no estilo rococó, as várias pinturas nas paredes, o Cristo Crucificado em marfim, a douração realizada por Manuel de Jesus Pinto até esse hoje no qual eu falo sobre ela nesse blog que é um pedaço de mim mesma.


Esse era para ser um post rápido e curtinho para registrar minha última visita a Matriz de Santo Antônio que fiz quando fui a Recife encontrar meu amigo Alexandre. Estava morrendo de saudades da Igreja então parei, entrei, sentei, conversei com o prédio todo até as paredes me conhecem, eu acho.

7 comentários:

  1. Adorei conhecer a igreja e sua história bem conmtada. Lindas fotos e detalhes trazidos! Ótimo fds! beijos, chica

    ResponderExcluir
  2. tenho muita vontade de conhecer recife. eu não sou religiosa mas visito igrejas, mas não vou a rituais. beijos pedrita

    ResponderExcluir
  3. Belo post, conhecer a História através de suas construções é sempre interessante e muito mais profundo que um olhar superficial. Adorei sua conversa com a Igreja e que nos contou.
    Abraço, Jaci!

    ResponderExcluir
  4. Boa tarde de sábado, querida amiga Pandora!
    Há quanto tempo não vinha aqui!
    Justo hoje que estava precisando de um afago espiritual, encontro seu post com uma belíssima igreja que conheci pois meu pai era pernambucano e estive lá viajando de férias.
    Gosto muito de igrejas assim. Me remetem as coisas bonitas da fé. Fico feliz por você saber apreciar a arte mesmo não sendo cristã católica.
    Parabéns!
    Seja muito feliz e abençoada!
    Beijinhos

    ResponderExcluir
  5. Olá, Pandora.
    Acredita que até uns anos atrás eu nunca tinha entrado em uma igreja católica? E quando entrei fiquei deslumbrada com toda a beleza. Mas aqui onde eu moro não tem muitas para se ver não.

    Prefácio

    ResponderExcluir
  6. Eu também acho que o simples ato de entrar nesse tipo de edifício nos 'transporta' para outro tempo e outras circunstâncias. E por ser uma igreja, é inevitável que a gente sinta também um certo apaziguamento na alma. Mas é fato que toda a história humana, incluindo nela com destaque, a religião e as igrejas, foi e é permeada por muita coisa feia. O único jeito de a gente viver de modo coerente é sermos nós mesmos fonte de fé verdadeira, luz e beleza. E, claro, focarmos nas coisas boas que existem na essência de quase tudo.

    Beijo

    ResponderExcluir
  7. Olá...
    Amei demais o seu post! Bem inspirador agora de manhã <3
    Sou católica e amo conhecer igrejas, principalmente essas no estilo barroco que são minhas preferidas! Sou devota de Santo Antônio, logo, fiquei aqui encantada com todo o seu post e, é claro, se um dia for visitar Recife essa igreja será uma parada obrigatória.
    Aqui em MG tem muitas igrejas nesse estilo e, mesmo pra quem não é católico como vc, vale super a visita, pois, são lindas e verdadeiras obras de arte e fé.
    Bjo

    http://coisasdediane.blogspot.com/

    ResponderExcluir