segunda-feira, 19 de agosto de 2013

O desafeto a literatura nos tempos do Império - Parte 2


Dando continuação ao texto da semana passada no "Sobre o desafeto a literatura nos tempos do Império" preciso reafirma a sorte que me considero com sorte por ter começado a aventura pelo passado através das mãos sonhadoras de José de Alencar. Depois dele a época do Império parecia para mim um lugar de sonho, melhor para se viver, quase substituindo a Idade Média de Walter Scott que o cinismo do meu professor de história transformou em um lugar de frio, opressão e cabanas de chão batido.

Maaaasss... no melhor da festa com seus finais felizes e homens capazes de se converter de seus maus caminhos me apareceu Machado de Assis e seu brilhante e inquietante "Dom Casmurro". Acho que Machado fez sucesso com a adolescente que fui porque já conhecia um pouco da sociedade imperial, do vocabulário do período, era muito fã de uma pessoa cínica (meu professor de História que nem mesmo aprova minha escolha por essa profissão #MagoaEterna) e claro, Machado dialoga com o leitor.

Em Dom Casmurro, nós conhecemos a história de Bentinho, membro de um família abastada do Império acompanhamos a história de amor dele com a Capitu. Como quem conta a história é o Bentinho ele conduz nosso olhar para onde quer e confesso: em minha primeira leitura fui meio seduzida por ele e até acreditei nas doces daquele velho rabugento, solitário e muito hipócrita. Algo que foi mudando ao longo das sucessivas leituras que fiz do livro ao longo dos últimos 10 anos e hoje sou do fã clube da Capitu correndo o serio risco de colocar o nome "Capitulina" em uma filha minha.

Depois de Dom Casmurro li o "Memórias Póstumas de Brás Cubas" e, apesar de Brás ser uma verdadeira cocada de sal com pimenta tão hipocrita quando o Bentinho, confesso que nunca consigo odiar esse personagem. Me apaixonei irremediavelmente pela sinceridade pós-vida dele; pela forma como ele coloca diante de nossos olhos as sacanagens daquela sociedade; e pelo capitulo sexy mais bem pensado da história de toda literatura, nunca deixei de ler o capitulo "O velho dialogo de Adão e Eva" sem dar risinhos e imaginar a cara das recatadas senhoras lendo isso! O Rafael Cortez musicou esse dialogo, deixo o link.

Depois desses dois livros comecei uma Odisseia alucinada com Machado: li todos os romances dele, os vários contos - ainda não sei se li todos os contos - e derivativos. De todos os seus romances o meu preferido é o "Memórias Póstumas...", a fina ironia toca o meu coração e me faz ri sozinha... O que mais me da ternura é Helena. Nunca existirá heroína tão incrível quanto ela. Doce, suave, gentil, inteligente, sagas, acima de tudo digna. Eu me precipito no caos cada vez que o Manuel Carlos coloca no ar uma protagonista com o nome de Helena em suas novelas. Aliás, eu detesto as novelas de Manoel Carlos e minha alma chora e se contorce cada vez que identifica uma referencia a obra do meu amado autor em sua obra. Provavelmente Machado se revira no tumulo.

Mas, voltando a minha louvação alucinada ao meu primeiro amor literário, nunca me canso do olhar atento dele, de sua capacidade de se comunicar com seu leitor, de enxergar de uma forma tão profunda as pessoas ao seu redor, a forma como elas pensavam, planejava e executavam suas vidas. Como a Jussara disse a respeito da sociedade imperial: "... como saberíamos quais sentimentos passavam pela mesma sociedade sem Machado de Assis?". Não é a toa que os historiadores do Império usam os livros dele como documento.


Além dos historiadores, quem se interessou por Machado foi o Eduardo de Assis, um professor do curso de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais responsável por vasculhar toda a obra dele, junto aos seus orientandos, em busca de referencias a pessoas negras livres, libertas ou escravas. Com todo o anacronismo do multiverso ele foi em busca das referencias a afro-descendência dele.

Embora hoje eu tenha minhas criticas ao Eduardo de Assis, confesso que o trabalho dele foi criterioso e a seleção de textos dele inclui crônicas, criticas de teatro, contos e trechos de livros foi uma boa aquisição para minha estante. Assim como a edição da correspondência de Machado e Joaquim Nabuco publicada pela editora de Monteiro Lobato. Confesso que quase tenho menos birra com Lobato só pelo fato dele ter feito publicar essa coleção de cartas.

Enfim, esse texto ficou gigante e você chegou até aqui e resolveu dar mais uma chance a Machado ou mesmo uma primeira chance ficaria feliz de emprestar meus livros... mas como não posso resolvi praticar um pouco da lição da Luma e bem entre os que se interessarem vou está sorteando aqui no próximo domingo minha edição de Helena junto com um dos textos biográficos da minha coleção.


Há quem diga que para começar a ler Machado é melhor recorrer aos contos, mas atualmente não tenho nenhum em minha estante - por culpa da Luma me desapeguei deles - então decidi por Helena, que é o romance de Machado em melhor estado físico dele em minha estante. Para concorrer basta dizer no comentário que quer e domingo que vem faço o sorteio e envio pelo correio.

19 comentários:

  1. Me identifico com o Bentinho, pois sou rabugento, solitário, ciumento e acho que até mesmo hipócrita, possivelmente um moralista pervertido.rs

    Agora, quer um conselho do seu tio? Não ponho o nome da sua filha de Capitalina, bem melhor Helena, não?rs

    Ah, não vale responder: Para o diabo os conselhos de você! rs

    Ótimo post!
    Cheros!

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    1. Como lhe disso Sr. Tio Verden, para mim o senhor tá mais para o Brás Cubas!!! Obrigada Tio!!! :)

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  2. Talvez eu tenha mesmo começado com o pé esquerdo. Mesmo sabendo da importância de Machado pra literatura brasileira eu não me sinto muito à vontade percorrendo o texto dele, a coisa não flui naturalmente - ou não fluía, faz muito tempo que não me arrisco, já uns bons dez anos - então acho que agora seria um leitor mais aberto a seu texto.

    Pra fechar, duas coisas: quero participar do sorteio. E, dois, você assistiu ao "Capitu"? O que achou?

    Dois abraços e boa semana ;)

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  3. Eu querooooo! Ainda não li Helena, amo Dom Casmurro, mas meu texto preferido de Machado é o conto "A Cartomante".

    Beijos

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  4. Obrigada pela menção! Meu Machado predileto é Memórias Póstuma,tenho tanto a falar dele que ainda não consegui fazer um post, risos...
    Minha filha caçula chama-se Helena, por que será?
    Você ainda vai fazer as pazes com Lobato, ele foi um homem do tempo dele e sem dúvida nenhuma um dos maiores editores que nós tivemos.
    bjs
    Jussara

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  5. Claro que eu quero, Pandora. Estou na parada! rs
    Li Machado há anos, reli alguns, mas também já há um tempinho. O jeito é reler, pois Memórias Póstumas de Brás Cubas tenho em casa.
    Quanto a sua filha se chamar "Capitulina", pode colocar simplesmente Capitu, fica mais bonito. rs
    Beijo e boa semana!

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    1. Lúcia, sabe o que é engraçado? Hoje parece um nome estranho, mas nos livros de Batismo do século XIX tem várias Capitulinas, era um nome comum.

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  6. Helena segundo dizem foi da fase romântica de Machado, talvez por isso seja ainda um pouco mais legal que os outros (não gosto mt do realismo). Eu tenho esse livro aki há séculos e não li ainda. Um dia eu tiro pra ler todos os clássicos da minha estante (nacionais e estrangeiros). Parece até promessa de ano novo né verdade? Beijos!

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    1. Ler mesmo Aleskita, deixa de ser ruim e cumpre a promessa!!!

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  7. Eu adoro Machado e de todos eu amo o Brás Cubas, mas a minha primeira paixão literária foi Memórias de um sargento de milícias e o Caso dos 10 negrinhos e o meu primeiro choque na literatura foi em Capitães de Areia!

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    1. Mi, eu também adoro o Memórias de um sargento de milícias, lembro que foi um dos livros que mas me despertaram o riso... Até hoje me pego lembrando dele dizendo: "Sou um cura e vou te curar" e morrendo de ri...

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  8. Machado figura ao lado do Monteiro Lobato como os maiores escritores desse país. Sem Lobato , a leitura não respiraria nesse país. E sem Machado, que leitores seríamos?
    Memórias Póstumas tb é o meu livro favorito do Machado, é sem dúvida, uma obra-prima, desde a inversão cronológica da narrativa a
    té à ironia inteligente do narrador-personagem. Gosto de alguns contos, como pai-conta-mãe ( que inclusive baseou um dos melhores filmes brasileiros que já vi " Quanto vale ou é por quilo?"). Capitu e Bentinho são algumas das personagens mais inteligentemente pensadas que já conheci e embora a história de amor deles dois me arrancou suspiros na adolescência e continua arrancando até hj, o livro é bem mais que isso..

    Conheço o trabalho do Eduardo de Assis e reconheço a importância,porém, a literatura tratada como documento histórico não me agrada muito. Claro que ela é uma fonte inesgotável para a história - e quiçá, a melhor delas. Mas muitas vezes tentam manejar o discurso literário para enquadrá-lo ao discurso histórico e isso acaba por excluir seu lado lúdico, estético. Para Foucault , a literatura está no devir, e a história, onde está?

    Bem, viva Machado! Só n é completo pq sua obra poética n é tão boa qt seus escritos narrativos. Mas graças a ele temos uma lente bem focalizada da sociedade oitocentista, hipócrita, como todas as sociedades, pois,o que torna a literatura atemporal são mesmo os vícios e virtudes humanos.

    Ah, e eu quero participar do sorteio. Bom texto, Pandora!

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  9. Oi Pandora!
    Eu sempre imaginei a Idade Média suja e fedorenta (fruto do "cinismo" de professor de história...).
    Hoje sei que os sentimentos das pessoas não mudou quase nada desde sempre e, por que seja importante sabermos História, devemos ler os romancistas...

    Abração
    Jan

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  10. Que droga, escrevi meu comentário e simplesmente n foi!
    Outro dia falamos então sobre o sr. Machado rs. N entendi a birra com o Monteiro, ele é tão importante quanto o Machado .

    Bjo

    Ah, quero participar do sorteio tb =D

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    1. Lane, meu desafeto a Monteiro Lobato também será tema de um post... tem uma história por ai... espere que eu conto!!!

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    2. Meu primeiro comentário foi ! rs , tinha dado erro na página. Aguardarei!

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  11. Olá, querida Pandora
    Li toda a sua coletânea pra fazer vestibular e me moldou muito...
    Tem a blogagem coletiva amanhã que vc me pediu pra avisar-lhe e é muita alegria tê-la conosco... Vou esperar VC...
    Bjm de paz e bem

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  12. Fosse "Morte e Vida Severina" um vestido, eu diria que fora costurado à mão em seu corpo, tão perfeito ficou!
    Eu já estava desconfiando desse teste que só estava aparecendo Drumond e Martha Medeiros. Você o salvou e com classe!
    Amanhã meu filho terá sua primeira discussão do livro Dom Casmurro. Lamento que essa semana o que ele mais ouviu foi os colegas dizendo que detestaram o livro. Meu filho adorou. Espero que venham outras leituras e ele chegue também ao encantamento por Capitulina!
    Quero sim participar do sorteio. Bj

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  13. Pandora, adorei seu post.
    Adoro Machado. Adoro o modo rebuscado de escrever machadiano. Adoro o charme de seus romances, porque, sim, Bentinho, apesar de ser meio frouxo e louco, tem seu charme. Brás Cubas tem me ganhado a cada página que leio. Li um livro de contos, "Papéis avulsos", e confesso que prefiro os romances. Quanto mais Machado, melhor.
    Tenho "Dom Casmurro", "Papéis avulsos" e "Memórias póstumas de Brás Cubas". Me falaram MUITO bem dessas memórias. Rasgaram elogios sobre ele, então eu realmente quase que passei da hora de finalmente lê-lo. Eis-me, então, lendo. Machado é tão lindo, tão gostoso de ser lido, que a gente quer ler logo tudo, mas tem pena de que acabe depressa.

    E, cara, essa pegada de dialogar com o leitor é sensacional. Uma vez me chamaram de Machado de Assis de saia porque às vezes faço dessas com meus textos. Eu gosto de escrever dialogando com o leitor. Acho que uma maneira tão tocante de escrever.

    E é claro que eu quero Helena. Eis outro livro que me falam tão bem e que eu preciso tirar minhas próprias conclusões deles. Mas... é Machado, né? Não pode ser ruim.

    Beijo, Pandora.

    Sacudindo Palavras

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