domingo, 15 de junho de 2014

Minha estranheza, as tatuagens não feitas e a difícil tarefa de conciliar aparência e essência.

Eu sou uma pessoa estranha, isso é fato conhecido por todos e eu não me envergonho de minha estranheza. Na universidade os meus colegas me chamavam carinhosamente "Esquisitinha!", mas recentemente uma amiga me deu o titulo de "bizarramente contraditória" e foi um elogio. Realmente eu faço metáforas malucas, escrevo e falo duas vezes antes de pensar. Fico mal humorada na segunda-feira. Detesto todas as coisas que predestinam as pessoas, as fazem de bobas e as tornam pouco menos que humanas. Sou cristã, feminista e geminiana. Mudo de ideia vez em sempre, há consenso entre meus amigos de que não sei brincar. E claro que tudo isso é culpa de Sagitário, afinal ele é que faz bagunça no meu mapa astral.

Eu cheguei a um ponto de estranheza gritante a ponto de uma de pessoa me dizer que não pareço com a pessoa que sou. Ou melhor, que a minha aparência estética não releva a pessoa que sou. Eu, honestamente, fiquei me perguntando com constância constante como as pessoas acham que eu deveriam parecer. Recentemente cheguei a uma resposta aproximada quando meu irmão falando sobre uma amiga dele disse que ela, com seu lindo cabelo verde vibrando e tatus mais lindas, ainda fazia tudo que eu queria fazer e não tinha coragem. Nunca pensei que meu irmão achasse que a ausência das tatuagens e a manutenção da cor original do meu cabelo fosse resultado de uma covardia. Talvez não seja.

Na verdade eu gosto da cor do meu cabelo com excesso de comprimento e amo o quanto é fácil cuidar dele, se eu aplicasse tintura nele não poderia me dar ao luxo de passar meses lavando apenas com sabão amarelo sem comprometer seu brilho e sedosidade. Antes de aplicar azul de metileno no cabelo preciso me comprometer espiritualmente com hidratações regulares e uma rotina de cuidados com as quais não estou habituada e não sei se quero está a curto e médio prazo. Em síntese, meu cabelo não é azul eu sou preguiçosa.

Já as tatuagens, aprendi com a Bíblia que algumas coisas, verdades ou desejos profundos devem ser escritos dentro de nós. No livro dos Provérbios está escrito: "Que o amor e a fidelidade jamais o abandonem; prenda-os ao redor do seu pescoço, escreva-os na tábua do seu coração." (Provérbios 3:3). Tenho a impressão que em minha alma há mais coisas escritas que no interior das Piramides de Gize, algumas tão difíceis de decifrar quanto os hieróglifos e eu gosto disso. Em síntese, gosto de ter minhas minhas palavras dentro de mim e não fora.

De certa forma essa imagem de crente acentua mais a minha estranheza e eu tenho um enorme fraco por ela, estou habituada a ela, e de quebra me da o beneficio da duvida. Com esse jeito de irmãzinha tanto passo despercebida quanto posso observar as pessoas que me interessam e escolher se vou me aproximar ou não delas. Claro, também aprecio a ironia, é divertido demais deixar as pessoas tontas com minhas contração bizarra.

Mas, apesar da ironia, da comodidade e de gostar dessa aparência, não por acaso, só pensar em como preguiçosamente mantenho essa imagem de irmãzinha me vem à memória a Tita me dizendo o quanto é boa ideia de deixar de vestir essa roupa confortável, essa farda, e assumir a imagem do que sou, conciliar a aparência com minha essência.

Só de pensar nisso, um velho soneto de Fernando Pessoa que escrevi há mais de uma década na minha alma começa a queimar como se tivesse sido escrito ontem. Repentinamente compreendo o quanto conciliar aparência e essência, no meu caso, tem haver com abdicação e abdicar pode ser até libertador, mas não é fácil de começar.

Atualmente, tal como Fernando Pessoa, embora talvez em graus mais modestos, "atravesso uma daquelas crises a que, quando se dão na agricultura, se costuma chamar "crise de abundância"¹ e me sinto como se estivesse a caminho de casa atordoada com um perigo de uma chuva que está por vim. E, talvez, meu irmão esteja certo, e eu ainda não tenha encontrado a coragem para abdicar de certas coisas e dizer tal como Fernando Pessoa disse em 1913:

"Toma-me, ó noite eterna, nos teus braços
E chama-me teu filho... eu sou um rei
que voluntariamente abandonei
O meu trono de sonhos e cansaços.
Minha espada, pesada a braços lassos,
Em mão viris e calmas entreguei;
E meu cetro e coroa - eu os deixei
Na antecâmara, feitos em pedaços
Minha cota de malha, tão inútil,
Minhas esporas de um tinir tão fútil,
Deixei-as pela fria escadaria.
Despi a realeza, corpo e alma,
E regressei à noite antiga e calma
Como a paisagem ao morrer do dia."

________________________

¹Carta de Fernando Pessoa ao amigo Mário Beirão, em 01 de Fevereiro de 1913  "Páginas Íntimas e de Auto-Interpretação", Ed. Ática. Disponível em: http://www.insite.com.br/art/pessoa/misc/carta.mbeirao.php

12 comentários:

  1. As pessoas tem essa ilusão de q o exterior precisa refletir o interior da pessoa. As que a aparencia apenas dá dicas de algumas coisas. Mas tipo se vc sente necessidade de pintar o cabelo de azul: pinte, se quiser fazer uma tatoo:faça. Faça o que for importante pra vc.Eu já cansei de procurar um estilo de vestir que diga algo sobre mim, pq não usar qq coisa e deixar q as pessoas s surpreendam um ´pouco?

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  2. E a culpa nunca é de sagitário!!! Sagitário é perfo!

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  3. Oi Linda!
    Já estava com saudades dos seus textos...
    acho esquisito essas pessoas normais que seguem um padrão social se despersonalizando. Vc me fez lembrar de mim, alguns anos passados, além de "esquisita", teve uma época que minha mãe, achava que eu não era normal rsrsrsrs, se a mãe pensava assim, imagine o resto rsrsrsrs.
    Tenha uma semana luz!
    Bjosssssss

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  4. Essa coragem é necessária e existe muito esses registros das pessoas que acreditam que o exterior mostra o interior. beijos,linda semana! chica

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  5. Eu tive muitos estilos durante a minha vida. Às vezes quando vejo uma foto de cinco anos atrás me assusto com as coisas que vestia, com os acessórios e tal. Hoje em dia com 52 anos, estou pegando mais leve, com medo de ficar ridícula... rsrs.

    Beijocas

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  6. Sinceramente, às vezes a gente muda a aparência justamente por não se encontrar interiormente. Já aconteceu comigo. Um tempo atrás, eu mudava a cor do cabelo a cada mês. Cheguei a ter uma fase "dark" com direito a unhas, maquiagem e roupas pretas.... até que um amigo me disse: "Nanda, joga fora esse esmalte preto que não combina em nada contigo". No fim ele tinha razão, eu que estava procurando alguma identidade. Hoje sou muito mais tranquila... estou deixando meu cabelo crescer e na cor natural, não me apego a nenhum estereótipo... uso o que quero de acordo com meu humor (que varia o tempo inteiro e dramaticamente). Tenho tatuagem e adoraria fazer mais, mas porque considero uma arte e gosto mesmo. Na real, não é fácil se encontrar em um mundo tão cheio de regras e referências contraditórias... acho que vale sempre aquela frase clichê: seguir o coração pra tudo!

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  7. Eu acho que a aparência tem que ser uma forma leve de expressão pessoal, acho saudável. Mas não gosto quando as pessoas, elas mesmas, às vezes se definem pela aparência - preciso mostrar que sou rockeiro, ou skater, ou qualquer outra coisa. A partir do momento que a aparência causa desconforto ou atrapalha em algo, não é legal pra mim.

    Eu curto tatuagens. Tenho medo de começar e não parar mais, gosto de pequenos lembretes ali na pele, sempre à mão. Talvez seja por isso que planejo que minha primeira tatuagem seja no pulso e a frase "keep the faith"

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  8. Jaci, já me disseram que eu sou "uma pessoa bem mais simpática" quando conversam comigo do que eu aparento à distância. Não sei, eu tenho o dom de fechar canais, de cortar conversas, de intimidar, de colocar no lugar, mesmo quando eu quero ser simpático. E não me acho tão sério assim, eu falo pilhérias, conto bobagens, mas na aparência alguma coisa faz com que pensem que sou sério ao extremo. Vai entender.

    Mas eu tenho pra mim que não quero mudar, apesar de ficar ressentido quando dizem que sou fechado ou coisa parecida, eu gosto de que eu sou na essência, se na aparência as coisas andam dissonantes, bom, que há de se fazer.

    Acho que viajei bastante. Não era minha atenção, mas teu post me levou por caminhos que não pude controlar - como só os bons textos fazem.

    Dois abraços. Ah, uma tatuagem ainda vou fazer.

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  9. Eu admiro imensamente essa "irmãzinha" que fotografa templos que não são os seus. Poucos têm essa coragem. Alguém que lê, aprende, questiona, confronta com ideias tão diversas.
    e eu estou assim como a Dama, quase nos cinquenta tô pegando mais leve e sigo sem tatuagens!
    Bj

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  10. Eu penso que o corpo é a roupa que nos é emprestado qdo iniciamos essa viagem e ele nos pertece, a nossa alma é de Deus! Do nosso corpo eu acredito ter permissão pra fazer tudo o que quero desde que isso não venha a prejudicar a vida de ninguém apenas a minha através das consequencias de minhas escolhas. Meu corpo não chegará ao céu, mas minha alma sim...então penso que talvez um corpo todo tatuado, cheio de furos e cabelos coloridos entraram ao céu desde que sua alma tenha se preservado "limpa", talvez os que se preocupem tanto em cuidar do corpo preservando sua forma genuina, esqueça de faxinar a alma (o que sei que não é o seu caso..) e isso o afaste do Pai. Só temos essa vida e vamos vive-la com toda a sua intensidade, responsabilidade e um tiquinho de loucura....loucura boa!!!rss

    Bjos
    Adoro seus textos!!!

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  11. Lindo texto e com ele você nos apresenta a sua essência e isto realmente é o que importa.

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  12. Oi Jaci! Acho engraçado essa imagem que as pessoas formam da gente, pelos nossos gostos e personalidade. Me identifiquei com seu questionamento pois, eu sou uma pessoa simples com ideias de gente "maluca", se nunca tivessem visto uma foto minha, me imaginariam cheia de tatuagens e cabelo verde, como se isso traduzisse a minha essência. Mas não, apesar das ideias malucas, do jeito liberal, me visto de calça jeans e tênis e meu cabelo não tem tintura. Que você continue sendo por fora a pessoa que se sente satisfeita e confortável, apesar do que os outros te falem. E álias, se você mexer no seu cabelão lindo, eu serei a primeira a reclamar hein!!

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