segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Blogagem Coletiva Lendas Urbanas: Cumade Fulozinha

Há quem diga que a lenda de Cumade Fulozinha, uma menina de longos cabelos negros, muito lisos que mora nas matas e é responsável por sua proteção é uma história totalmente rural, mas Nova Descoberta é um bairro que surgiu majoritariamente a partir da década de 1950 e as casas foram avançando através da mata que existia aqui então muitos dos moradores de meu bairro tem muita história para contar sobre esse personagem.

Minha mãe conta que meu bisavô Arthur, homem taciturno, caladão, cheio de manias, cujo passatempo maior era caçar, ao se preparar para se embrenhar nas matas jamais deixou de preparar um rolo de fumo para deixar a Cumade e nunca deixou de se portar com respeito em seu território, caçando apenas aquilo que seria consumido na refeição e em hipótese alguma proferindo palavras feias ou de baixo calão no terreno a ela pertencente.

Tudo isso era mata antes de 1950.
Mas, quem realmente afirma a realidade da existência desse personagem é o primo Bastião. O primo Bastião conta que quando jovem se embrenhou na mata para caçar com os outros primos, porém resolveu em um arroubo da juventude não deixar fumo para Cumade Fulozinha, ato que sozinho já foi suficiente para deixar todos os outros primos amedrontados e suspeitosos em relação a qualquer pé de vento ou barulhinho de bicho.

A atitude pretensiosa dele deixou todos amedrontados e irritados tanto que logo começaram a recrimina-lo por tamanha falta de prudencia. Homem nordestino, ignorante até o talo, e no calor da juventude, ele logo se irritou com todos eles e começou a falar palavrões e xingamentos baixos em plena mata. "Que Cumade Fulozinha que nada! Isso não existe!Vocês vão ver! Olha só o que digo para essa Cumade #%&*#$%&*".

Diante de tamanha falta de prudencia os outros primos se recusaram a continuar em companhia dele e voltaram para casa abandonando o primo Bastião sozinho na caçada.

Uma vez sozinho o primo Bastião conta que de repente ele se viu em uma clareira com mato baixo e um silêncio de morte se fez na mata, não se ouvia nem um pio de passarinho, nem um barulhinho de galho quebrando, nada de nada até que um vento frio soprou desafiando o calor do sol e de repente apareceu diante dele uma menina de mais ou menos um metro e meio de altura, cabelos negros chegando aos pés divididos em duas longas tranças que apenas questionou: "Então você não deixa meu fumo e ainda fala palavrão na minha mata! Vamos ver se eu não existo!".

Ao vê-la se aproximando o primo Bastião conta que se pôs a correr desesperadamente mata a fora com ela em seu encalço lhe chicoteando o corpo todo com as tranças do cabelo até deixa-lo meio morto e completamente chicoteado, cheio de vergões pelo corpo todo em um castigo exemplar para a sua má conduta.

Se é verdade ou mentira eu não sei, mas realmente ele chegou em casa meio morto depois dessa aventura, com o corpo todo coberto de vergões e até hoje jamais esquece de levar o fumo de rolo e não falar palavrões ou desafiar aquilo que ele não entende quando está dentro de uma mata.
______________________________

E essa foi a minha participação na Blogagem Coletiva: Lendas Urbanas, proposta pelo Christian V. Louis do Escritos Lisérgicos.

Tá, quem me contou essa história não foi o primo Bastião e sim, se a memória não me trai, minha tia-avó Edite (Didi), eu não vejo o primo há mais de duas décadas, mas conta-se que realmente ocorreu dele ir caçar com os outros primos, ser deixado sozinho na mata e voltar para casa todo lapiado culpando a Cumade Fulozinha pelo ocorrido.

No blog "O historiador e o tempo" é possível encontrar o texto "Comadre Fulozinha: a dona das matas" cujo conteúdo esclarece um pouco mais a cerca desse personagem característico da cultura nordestina.

32 comentários:

  1. SENSACIONAL! Gostei muito, mesmo!
    Tanto falam e estudam a mitologia grega, romana, chinesa etc., e a nossa?, o nosso folclore?, é riquíssimo!

    Abração,
    Rodrigo Davel

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    1. Estou com você e não abro Rodrigo! Nossas histórias são tão encantadoras e ensinam tanto quanto as gregas, romanas, chinesas e derivativos. É fundamental estuda-las.

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    2. Olha Pandora essa historia e realmente verdadeira pois moro do lado de nova descoberta e la ainda resta uma mata onde tem clareiras naturais a mata la e a mata do eucalipto do alto do eucalipto e como seu tio saberia que la tem clareira? o que comprova a veracidade do relato dele , fora que eu ja vi a cumadi fulozinha e nao e uma lenda , cumadi fulozinha e uma falange de espiritos de ancestrais indigenas, para cada um e um espirito diferente , a que eu vi se assemelhava a Taina e essa visagem anda nas matas de dois unidos ,ja esse espirito que seu tio viu ainda deve se encontrar em nova descoberta na mata do eucalipto sendo mais precisa ou talvez por ser espirito de floresta fechada tenha ido pras matas do interior , isso nao e de se brincar essa falange chamada de cumadi fulozinha tambem e cultuada no catimbo da Paraiba .

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  2. Eu simplesmente adoro esses "causos", contados, geralmente, por pessoas mais velhas, por pessoas simples, mas de grande conhecimento da vida, e que sabem que lendas e assombrações são coisas que elas viram, e que não querem ver nunca. Interessante demais o respeito que essas pessoas têm por essas "entidades" do lendário brasileiro. Aliás, o lendário brasileiro é dos mais belos, é apaixonante. Como terra paradisíaca (que já foi...) tem muita sensualidade: Iaras, Botos Rosa, e esta que acabo de conhecer: Cumade Fulozinha, muito jovem, cabelos negros e longos - o cabelo sempre ocupou o imaginário do homem - Pobre de quem a subestima...

    Maravilhosa essa postagem, Pandora! Uma das melhores que li até o momento.

    um beijo!

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    1. Pois somos do mesmo clube Ligéia! Tem gente que só da valor a cultura escrita e esquece que através da oralidade muita sabedoria e conhecimento de vida se conserva. Sim, o lendário brasileiro é riquíssimo!

      Obrigada Ligéia, muito bom te ver por aqui!!!

      Cheros.

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  3. Olá Pandora!

    Voltei! :)

    Gostei da tua participação na bc, ao que parece é bem verdade. Que susto o teu primo apanhou! Eu teria morrido de medo...

    Beijos e parabéns!

    Cris Henriques

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    1. Pois é Cris, ele levou um grande susto mesmo! Eu também teria morrido de medo! rsrs

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  4. Adoro ler estes causos de nossa cultura. Agora, sendo ou não a tal Cumade Fulozinha que deixou seu irmão apavorado, não é demais se precaver, ahahhaa...
    Estou adorando esta BC, tem cada texto legal! Uma experiência riquíssima para nós todos. Parabéns pela sua participação.

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    1. Esse é o ponto Marina, se precaver nunca é demais rsrsrs... Eu também estou adorando ler os textos.

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  5. Hahaha. Adorei!
    Nunca tinha ouvido falar da dona fulozinha não, apesar de ser de família nordestina.
    Muito boa a sua participação. Parabéns!

    Beijos. :**

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    1. Ah, que bom que você gostou Nadia!!! Fico feliz em ter sido eu a responsável por te apresentar a Fulozinha :)

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  6. Não conhecia essa história, mas já ouvi muitas outras sobre fantasmas em matas... o povo contava tão certinho que era difícil duvidar da veracidade.
    Como vc mesmo disse, se é verdade ou não, quem somos nós pra duvidar, né? Deixemos tudo como está, cada um com seu cada qual.

    Essas histórias são de arrepiar...
    Beijos

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    1. Pois é Clara, deixemos cada um com seu cada qual e aproveitemos para nos divertir com as histórias passando-as sempre para que se mantenha a memória dessas lendas que encantam gerações.

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  7. Do jeito que sou desbocado, penso que nem preciso ir pra mata pra deixar essa Dona Fulozinha tensa, aliás, eu penso que ela esteja entre nós aqui na blogosfera, tamanha esta sendo a campanha anti-palavrões. Tem dedo dessa mulher aí! ahaha.
    Brincadeiras à parte, tal como a Clara, já ouvi muito falar sobre espíritos da mata e isto é bastante debatido, como sabe, principalmente na umbanda. Este negócio de deixar fumo lembra exu-mirim e falange dos caboclos.
    Muito legal sua participação Pandora. Meus muitos parabéns!


    => CLIQUE => Escritos Lisérgicos...

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    1. kkkkkkkk Eu ri Christian!!!! Obrigada você pela ideia :)

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  8. Pandora,
    Que texto delicioso de ler!
    Acho que esses "causos" são muito bons de "ouvir" porque sempre existe neles alguma verdade. Penso sempre que, mesmo tirando o que é mentira, sobra um bom tanto de verdade e isso é emocionante!
    Eu não conhecia essa lenda e acho que por isso gostei tanto da sua postagem. Muito bom! Parabéns!

    Um grande abraço!

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    1. Oh Isa, que bom que você gostou do meu texto. Causos são mesmo deliciosos, foi um prazer compartilhar essa história familiar aqui no blog!

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  9. Que Cumade mais brava!!! Gostei do conto, não me deu medo como imaginei, acho que a Cumade é um espírito bom no final das contas!

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    1. Também acho Mi, ela só meche com pessoas que não respeitam a natureza. E tem essa coisa da moral e bons costumes por ser um personagem do inicio do século XX, quando a sociedade era um pouco mais conservadora.

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  10. OLá Pandora boa noite!!

    Pra falar a verdade minha querida, eu desconhecia a Cumadi Filozinha, mas pelo visto a danada era ( ou é ?) arretada de brava, né mesmo? Penso que seria uma delícia bater papo com a sua tia Edite, hehehhe, deve ter muitas histórias.
    Me diverti aqui com o comentário do nosso parceiro Christian, dizendo-se desbocado..Ai..ai..ai...ele que não brinque com a Cumadi, senão vai ter o mesmo destino do teu primo...kkkkkkk.

    Adorei o teu conto, pela novidade, pelo jeito divertido como o contou e de uma forma super agradável de ler!

    Obrigado , hein , pelo elogio delicioso que deixou lá no Sementes Preciosas!!

    Beijos da LU...

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    1. Pois é Lu, ela é braba mesmo, arretada até o osso, ciosa de proteger nossas matas. E sim, tia Didi é uma narradora em potencial com uma memória invejável. E que bom que você gostou de meu causo familiar.

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  11. OI Pandora
    Nossa fiquei arrepiada com esta historia,meu avó sendo indio sempre nos contava que pedia licença para entrar na mata. Aqui no Pará tem a Matinta pereira, já comentei sobre ela no meu blog,aqui Se quiser conhecer é neste link:
    http://eternamentevv.blogspot.com.br/2012/02/lenda-da-matinta-pereira.html
    Adorei conhecer esta lenda.
    Parabéns por sua participação, diferente das que já li.
    Beijinhos.

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  12. Legal
    Muito legal.

    Adorei essa blogagem.
    Nossa agora pergunto quem será que "contou", ou foi testemunha da primeira versão de uma lenda?kk

    Bjs
    Debby :)

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  13. TÔ plenamente de acordo, afinal não se vai à casa de alguém para insultar e incomodar.
    Não conhecia mais esta lenda do nosso folclore, seja lenda ou causo, mas o que importa é que é nosso, nascido da criatividade ou crença dos nossos ancestrais.
    Sou um tanto bairrista,rsrsrs.
    Òtima participação, Pandora. Vc trouxe pra BC uma das nossas tradições orais, o que a deixa ainda mais fervilhante.
    Bjos,
    Calu

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  14. Pandora, que história!! Quando vim morar no Rio, me disseram que tinha que pedir permissão para Iemanjá para entrar no mar. O mesmo deve acontecer nas florestas, mas eu nunca tinha ouvido falar da Cumade Fulozinha.
    Fui no link que disponibilizou e deletaram o blogue... será que foi a cumade? :) Então fui para a wikipédia e o primo Bastião não mentiu... Bom saber, se entrar em mata nordestina tenho que levar fumo, mingau e mel para amassar a menina.
    Você sabe que sou curiosa e descobri que no youtube existem vários filmes contando a história da cumade e até mesmo a existência de uma banda com o mesmo nome, em homenagem a essa lenda que parece bastante integrada na atualidade.
    Boa semana! Beijus,

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    1. Caraca, essa de vários filmes eu não sabia, mas a banda já ouvi falar e agora que vc falou acabei de lembrar. Sabe Luma, eu sempre tive um pé atrás com essa história do primo, sempre fiquei pensando se ele não se cortou com o mato alto, sei lá, mas quando até a Wikipédia diz coisas que ele diz você já começa a pensar: "Será?"

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  15. Oi Pandora
    Eu não conhecia essa lenda, acho que é mais típico de sua região, o mais legal dessa blogagem foi que cada blogueiro pôde contar um pouco de sua região. Muito boa sua participação na BC. Muito bem escrito a história.
    Bjão. Fique com Deus!

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    1. É sim Luciana, um caso tipico da minha região, especificamente Paraíba e Pernambuco, que bom que você gostou.

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  16. Nunca tinha ouvido essa lenda, mas aqui em Araraquara em uma usina tem uma area de mata preservada, dizem que para entrar lá caso for cortar uma arvore tem que pedir licença, pois se não a pessoa apanha, se é vdd não sei mas a lenda corre solta por aqui, tem coisas que não explicamos eu que não quero ver com meus olhos kkk, gostei demais.

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  17. Caramba, Jaci, que história legal!
    Me lembrou uma outra história que ouvi lá no campo, do verdadeiro vô Bastião, e que podia ter contado na blogagem.
    Mas, enfim, adorei mesmo a história.

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  18. Desconhecia essa lenda e foi muito interessante saber desses detalhes.
    Sabe que agora gostaria de saber sobre as lendas que existem e quem sabe abro uma coluna lá no Mamyrene.
    Gostei muito e o que nossa vovó não nos conta em suas histórias né e como nossa memória não esquece.
    Beijos

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  19. Acho linda sua hístoria , retratou bem essa cabocla entidade da mata atlântica nordestina , inclusive até hoje em nova descoberta existe duas matas atlânticas uma fica bem próxima do alto do Eucalipto sempre que passo por lá sinto uma energia bem forte dentro dela acredito que esse espírito ainda habita por lá.....

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